Respeito, temor e a festa junina da Secretaria Estadual de Segurança Pública

A revelação de que a Secretaria Estadual de Segurança Pública (SSP) vai realizar amanhã a tardia Festa Junina de seus funcionários traz reflexões. A primeira delas se refere aos comentários, postados neste blog, dando conta de que “faltou respeito” para com os membros da pasta, na forma como a notícia foi postada aqui e falada na rádio CBN Manaus. Temo que esse pedido de “respeito” seja uma exigência de tratamento com o mesmo temor e simploriedade que caracterizava certos setores da mídia ancestral, onde incensar autoridade era natural e, em alguns casos, até obrigatório. Há uma interessante discussão de conceitos, princípios e preconceitos que precisa ser melhor esmiuçada no caso.

A sociedade de castas, que faz com que na Índia mulheres de estamentos inferiores da sociedade sejam tratadas como objetos e possam ser, impunemente, estupradas no ônibus, no metrô ou nos recantos ermos das aldeias, é hoje objeto de repúdio da sociedade mundial. O “tratamento diferenciado” a certos segmentos da sociedade, como se fossem seres de outro planeta, intocáveis, é uma forma de discriminação inaceitável, que ainda hoje subsiste no Brasil e precisa ser combatida.

Já houve tempo em que magistrado, advogado, delegado ou médico, entre outras profissões desse porte, eram considerados doutores. Não importava a escolaridade. Doutor e ponto final. Em Parintins, houve o episódio de um filho da terra muito simples, de família humilde, que voltou formado em Direito e exigindo ser chamado de doutor e que os colegas de infância lhe beijassem o anel.

Isso criou um distanciamento que tem reflexos os mais diversos. Agora mesmo, nas manifestações de rua, policiais são tratados com deboche pela população e, sem qualquer razão, explode um ódio que se traduz em cusparadas, pedradas e ataques físicos de toda ordem. A massa parece não distinguir entre o cinismo das autoridades que lesam o erário e o profissionalismo da polícia, como se todos constituíssem o que há de pior na humanidade e estivessem despidos da condição humana.

Pode ser, e a psicologia social deve dirimir a dúvida, que se trate de uma tentativa pervertida de romper o distanciamento de todos esses anos. Policial é um agente social, com filhos, pais, amigos, laços religiosos etc. Ninguém precisa ficar cheio de dedos para tocar num tema que fira as suscetibilidades da cúpula da segurança pública, até porque quem está na rua é o mesmo soldado ou agente agora escalado para fazer o churrasco ou gelar a bebida. Alguém precisa dizer que emitir memorando estabelecendo feriado para quem “confirmou presença” na festa junina é uma forma de chantagem desrespeitosa para com o erário e o cidadão que, indo ou não às festas na empresa, precisa cumprir o expediente até o fim e pagar religiosamente os impostos que bancam os salários dos agentes públicos.

Respeitar o policial é obrigação da sociedade. Assim como oferecer o mesmo tratamento ao gari, à dona de casa, ao juiz e à presidente da República. Sem submissão e sem afrouxar o espírito crítico. Respeito sim, temor jamais. Afinal, o Brasil está nas ruas, em pleno processo de mudança. No  lugar da exigência de um “respeito” que não cabe, numa sociedade livre, ou de qualquer tentativa inútil de usar autoridade para intimidar, que tal rever a festa e torná-la uma confraternização comum, que não fira o expediente nem use o tempo de trabalho que pertence ao cidadão como prêmio?

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2 comentários

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  1. Elson disse:

    Tanta coisa errada neste Estado e vc se preocupando com festinha! MARCOS fala dos buracos da cidade com a mesma intensidade! Dá um de cri cri com os buracos o Hissa está perdido com tanto buraco! Mais talvez o foco é derrubar o secretario de Segurança!!!

  2. thadeu seixas disse:

    Nada contra festas de confraternização…natalinas, juninas, etc.
    Mas por que será que todas as festas de funcionários públicos têm que ser em dia útil???
    Por que não fazem no sábado???
    Curiosidade apenas….