Paulinho Faria está de volta ao Garantido, comentando na Band

O presidente do Garantido, Telo Pinto, confirma: Paulinho Faria acertou com o bumbá para ser o comentarista, durante as apresentações do mesmo no Festival Folclórico deste ano, na transmissão nacional feita pela Band. Muito bem. Trata-se do apresentador que, em seu período de quase 30 anos à frente do item, foi responsável pela fidelização de grande parte da torcida do vermelho e branco. Conto, a seguir, algumas histórias que compartilhei com ele.

Amigo, colega de sala no 2º Grau inteiro (hoje Ensino Médio), ele estava nos primeiros anos à frente da apresentação do Garantido. Enfrentou José Maria Pinheiro, Raimundo Pimentel e Rubem dos Santos, meu irmão, já falecido, além de um aguerrido e talentoso Armando Carvalho, hoje em Santarém.

Aí por volta dos 14 anos, colegas de rádio Alvorada, ele me chama para apresentar o Garantido com ele. Fui ao primeiro ensaio e estou lá, em pleno “Dois pra lá, dois pra cá”, ao lado de dona Maria Ângela, mãe dele, esperando o  momento de ser chamado por ele para subir ao palco e começar os trabalhos, quando Rubem, com a autoridade de irmão mais velho, segura-me pelo ombro e me diz, ao ouvido: “Você quer apresentar boi bumbá? Então venha conhecer a história da nossa família”.

Ali mesmo, enquanto saíamos e caminhávamos pela noite úmida de Parintins, da Baixa do São José a nossa casa, na Francesa, ele me contou sobre Luiz Gonzaga, nosso tio, irmão de nosso pai, Zé Caiá.

Padrinho (cargo que correspondia ao de proprietário) do Caprichoso de 1937 a meados da década de 1960, calafate e pescador, ele calafetava os barcos dos mais abastados da cidade, como Raimundo Dejard Vieira e Elias Assayag, ambos já falecidos. Levava para gente como eles, ao longo do ano inteiro, o melhor da pesca, sem cobrar absolutamente nada. Tudo o que queria, em junho, era os recursos para fazer a roupa da Marujada de Guerra, o veludo preto para o “couro” do Boi Caprichoso e o pó brilhante para enfeitá-lo.

Muito doente, tuberculoso, numa época em que a doença não tinha cura, precisando de repouso, teimou em “botar” o boi na rua. E mais: ninguém conseguiu demovê-lo de dançar embaixo da “Dona Aurora”, a grande boneca de pano que outro tio nosso, Santarém, fabricava para o bumbá. Brincou como nunca. Cumpriu todos os compromissos. Circulou as fogueiras que esperavam pelo azul e branco em vários pontos da cidade. Ao voltar para o curral, na rua Rio Branco, tarde da noite, levantou “Dona Aurora” cuspindo sangue. E partiu.

Como não me comover com uma história dessas? Indaguei de meu irmão: “Como é que eu não sabia disso?” E ele: “Aprenda uma coisa. Nós vivemos num País sem memória. Nem a nossa própria história nós conhecemos”.

Uma noite inesquecível. Dia seguinte, pedi desculpas a Paulinho. Nas três últimas noites de junho estava na quadra, fantasiado de apresentador, sussurrando “dicas” ao ouvido de meu irmão. Feliz da vida. Esforçando-me para fazer jus à minha história.

Em 1987, vida profissional engatada em Manaus, sou convidado a apresentar o Caprichoso. Minha missão: diminuir a diferença para Paulinho Faria. Empatamos. Outros ganharam dele, mas sabem que isso foi bobagem de jurado. Nesse ano, os jurados foram para a arena, responder à torcida e a quem mais quisesse perguntar, sobre as razões de cada nota.

Trocamos manifestações de respeito mútuo ao longo da disputa e baixamos um pouco a temperatura revanchista e de enfrentamento pessoal que havia então. O Boi Bumbá de Parintins é muito mais que isso.

Paulinho Faria, em 1988 e 1989, superou-se. Cantou muito mais, mexeu com a torcida como nunca, ensaiou com cada item, mergulhou no galpão. Em 1988, inauguração do Bumbódromo, o Caprichoso ganhou Arlindo Jr., como levantador de toadas. Melhorou muito a relação com a torcida.

Eu, tendo que sobreviver em Manaus, criando dois meninos recém-nascidos e dedicando apenas dois ou três dias antes da festa ao Caprichoso, não resisti. Passei o bastão, derrotado nesses dois anos. Ficou a certeza de ter feito o melhor, com toda a humildade, para continuar a brincadeira iniciada pelos meus primeiros e da qual Rubem dos Santos foi presidente.

Paulinho, seja bem-vindo à nova Era do Bumbá. Registro que Alan Rodrigues fez o máximo, nos anos anteriores, considerando a história muito recente dele no Garantido. Conte agora os bastidores, as raízes da nossa festa. Fale de sentimento e de emoção, como você sabe fazer muito bem. Não se deixe levar pelo neo-fanatismo, que é rasteiro, pequeno, e nos diminui perante o Brasil. Faça bonito.

Nós aqui, do lado do Caprichoso, saberemos fazer a nossa parte. Boa sorte, mas nem tanto, porque, você sabe!, nós também queremos ganhar.

Veja também
Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Benito Gonçalves disse:

    Marcos,
    Parabéns pelo Blog

    Gostei da matéria e peço permissão para publicar no nosso Jornal Regional, aqui de Parintins.
    Com certeza colocarei sua assinatura na matéria.

    Um forte abraço

    RESPOSTA:

    Obrigado, Benito. Fique à vontade.

  2. Paulinho Faria disse:

    Amigo Marcos; Estou muito feliz com o convite e vou procurar corresponder dando o melhor de mim, afinal, você conhece o meu amor pelo Garantido.Obrigado pelas palavras de incetivo, você sempre foi amigo verdadeiro, mesmo no auge da enorme rivalidade dos anos 70 e 80. Felicidades.

    RESPOSTA:
    Paulinho, em breve vamos à Ilha, para rever os amigos em comum, como Zé Neto, Gersinho e Bernardo, assim como voltar a fazer propaganda na picape amarela, da Jotapê. Boa sorte na nova missão.

  3. Eduardo Gomes disse:

    Marcos,
    Parabéns pelo texto. São testemunhos como este que engrandecem o Festival de Parintins, enriquecem o conteúdo histórico de um folclore.

    Abraços,