Paulinho Du Sagrado é daqueles compositores que inscreveram os nomes na história da toada de boi bumbá. Ele acaba de ter aprovada, no Garantido, a toada “Consciência Negra”. Enviou ao portal um “demo”, mas, na voz de Edilson Santana já veio bem trabalhado.
Du Sagrado criou uma espécie de personagem de si mesmo. Afável com os amigos, carinhoso mesmo, não suporta quando alguém lhe pisa os calos. A coluna Panavueiro contou a história dele com um presidente de comissão de arte de bumbá. Queria mudar o nome da toada “Um transe na imaginação” para “Boi vencedor”. Diante da proposta ele respondeu: “Quer dizer que você, Antonio, resolveu mudar o título da minha toada?” “Que Antonio? Você sabe que meu nome não é esse”. “Se você pode mudar o nome da minha toada, eu também posso mudar o seu”, respondeu Paulinho.
A melhor linguagem dele, no entanto, é mesmo a da música. É nela que se encontra o talento no estado mais puro. Melhor ouvir a mais recente criação do autor, que ainda receberá roupagem final.
Ouça a toada e acompanhe a letra, seguida de pequeno trecho da pesquisa feita para a composição, enviada pelo autor:
Ouça Consciência Negra
Autor: Paulinho Du Sagrado
A CONSCIENCIA NEGRA, A BELA ARTE NEGRA
A CIÊNCIA NEGRA, A ASCENSÃO DOS NEGROS
É HISTÓRIA, É MEMÓRIA PRATICADA
NO MOCAMBO OU REFÚGIO O SOFRIMENTO A SUPERAR
ESCRAVOS LIVRES, LIBERTOS, ESQUECIMENTO, OCULTAMENTO
O SILÊNCIO NO AMAZONAS A ESVAZIAR
TODA VISÃO DO DESENCANTO NA ALMA NEGRA
FOI A REBELDIA À AUTONOMIA DE UM LAR
A RESISTÊNCIA É UMA LUTA PERMANENTE
POR ESPAÇO MAIS DECENTE NO DIREITO A SE IGUALAR
A LIBERDADE É O VALOR DA IDENTIDADE
A QUALIDADE DESSA RAÇA A NEGRITUDE DE VIVER
EXPRESSO CANTO E SUAS DANÇAS
NO BATUQUE DA MARIMBA, DA VIOLA E DO XEQUERÊ
DERRUBA MASTRO COLORIDO NA FESTANÇA
REZA A SÃO BENEDITO A INTERCEDER NESSE VIVER
DANÇA O LUNDU, O CARIMBÓ MAIS RELENTADO
O URUBU DO VER-O-PESO FAZ DONA ONETE SE INSPIRAR
AINDA ASSIM O PRECONCEITO REPRODUZ TANTO DEFEITO
ATÉ AONDE A TOLERÂNCIA NÃO HÁ
A AFIRMAÇÃO A IDENTIDADE É O CAMINHO
QUE EXALTA OS NEGROS DO MEU BOI-BUMBÁ
O HIP-HOP, A CAPOEIRA, O BERIMBAU NA CACHOEIRA
SÃO ANDANÇAS DESSE POVO NO ALEGRAR
O MEU DESTINO É O BEM DE UM MENINO
SOU FILHO DE CATIRINA O QUAL NUNCA SE OUVIU FALAR
A EXPRESSÃO MAIOR NÃO SE CONTÉM
NAQUELA CARTA DE ALFORRIA E O RESPEITO LIMITAR
O NEGRO É CONCEITO ESCRITO E IRRESTRITO
NA PELE, NOS OLHOS E NA ALMA BRASILEIRA
AINDA ASSIM O PRECONCEITO REPRODUZ TANTO DEFEITO
ATÉ AONDE A TOLERÂNCIA NÃO HÁ
A AFIRMAÇÃO A IDENTIDADE É O CAMINHO
QUE EXALTA OS NEGROS DO MEU BOI-BUMBÁ
A CONSCIENCIA NEGRA, A RESISTÊNCIA NEGRA
Du Sagrado também ao Portal do Marcos Santos uma parte do seu trabalho de pesquisa. Leia:
“A expressão de uma raça se expõe nos diferenciais externos dos seres humanos (fenótipos) – cor de pele, forma de nariz, cor dos olhos etc. – que representam 1%, entre as raças branca, amarela, indígena e negra. Os demais 99% da constituição humana são absolutamente iguais (genótipos).
Derivados dos afrodescendentes, os pardos e os pretos, segundo IBGE – 2014, são maioria no Brasil, representando 53,6% da população brasileira. Na parcela de do 1% mais ricos (renda média de R$ 11,6 mil por habitante) 79% eram brancos e apenas 17% de negros. De outro lado, no grupo 10% mais pobres (renda média de R$ 130 por pessoa), os negros representavam 76% e os brancos participavam com 22,8%.
Existe uma história dolorida dos negros, desde a escravidão, na busca de espaços para legitimar suas ações e garantir os seus direitos. E essa condição somente se alcança quando as oportunidades permitem, sem preconceitos, uma efetiva ascensão social e econômica.
Contextualização
Essa obra se propõe a contextualizar as sequências das ações dessa raça, em todas as vertentes possíveis no tempo restrito da música. Evidencia o processo de ascensão pela consciência que se trata de dois legados: a sabedoria e o discernimento diante de cada estágio até os nossos dias.
Muito se faz pela cultura, em múltiplos aspectos tais como: a música, a dança, a estética das artes, etc. Ainda que os filmes persistam protagonizar aos brancos os papéis principais, como Elisabeth Taylor em Cleópatra – rainha egípcia do norte da África, cabendo aos atores negros os papéis de servos e vilões.
De outra parte, o continente africano originou as revoluções científicas e tecnológicas que servem de base para o desenvolvimento da humanidade. Os pigmentos de tinta possuem 400 mil anos de idade numa caverna de Lusaka, na Zâmbia; o cultivo de algodão no Sudão a 5 mil anos A.C. e a melancia cultivada 7 mil anos A.C., o calendário até atualidade, a matemática de base 10, a medicina com a mumificação, o empirismo e a neurociência. A engenharia das pirâmides estradas de ferros, portos, docas e a invenção do torpedo. Woods inventou o transmissor do telefone, sistema ferroviário, sistema de metrô, montanha russa. Dra. Cooke oncologista que elevou a quimioterapia a opção de tratamento de câncer; Nahoun especialista em cirurgia robótica cerebral.
A escravidão e o racismo atrasaram o desenvolvimento, mas não cessou completamente. Enfim é preciso reconhecer aos negros os seus elevados atributos e eliminar a diáspora que Mandela evidenciou.
ERA E É TEMPO DO BOI-BUMBÁ, “uma estranha folia” aos olhos de viajantes do século XIX, como Henry Bates, Robert Avé-Lallemant e Sanches Frias. Um “boi” que vai marcando a calha do grande rio, uma festa de negro, lugar dos filhos de Mãe Catirina e Pai Francisco.”
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