Último ano da Band, Coca-Cola não renova e Garantido paralisa preparação. O Festival de Parintins está sob risco

O Festival de Parintins, inesgotável fonte de criatividade dos artistas da terra, corre o risco de perder duas de suas principais conquistas: a transmissão nacional pela TV, via Band, e o patrocínio âncora da Coca-Cola, capaz de transformar a festa num produto adicionado à sua própria marca e exibi-lo em formato de anúncio, nacionalmente, em todas as redes de TVs,nos últimos 15 anos.

Representantes da Band estão em Manaus para negociar com os dirigentes de Caprichoso e Garantido, mais o Governo do Amazonas, para transmitir ao vivo, em cadeia nacional, apenas a noite de sábado (30/06), no Festival de Parintins. Sexta (29/06) e domingo (01/07), a transmissão ao vivo ocorreria apenas na Região Norte, enquanto o resto do País veria a festa duas horas depois do encerramento, ou seja, nunca antes das 2h30, madrugada fechada.

A Band “tirou o pé”. Representantes da emissora têm dito que o contrato de transmissão nacional da festa, que termina este ano, será renovado. Suspeito que não é bem assim. Qual seria a reação dos bumbás se ouvissem, na lata, que o contrato não será renovado? Fariam com que o acordo vigente, que começou em 2010 e termina este ano, fosse cumprido à risca, sob pena de a emissora pagar a multa prevista.

Sob a alegação de que se tratava de “produto novo”, os bumbás, este ano, contrataram outras empresas de TV para DVD e DVD/Blu-Ray de toadas. A festa ficou bonita, os produtos finais idem. Já o humor dos dirigentes da Band…

Soube também, por uma fonte confiável, que os dirigentes da Coca-Cola Indústrias, a representante brasileira da empresa, não vão renovar o patrocínio do Festival de Parintins, hoje em torno de R$ 1,2 milhão para cada bumbá.

O que aconteceu, no caso da Coca-Cola?

O motivo explícito é que os bumbás propuseram um reajuste no valor do patrocínio considerado absurdo pela indústria. A diretoria ficou indignada ao ver que a majoração não se baseava em nenhum índice econômico – era bem superior a todos eles.

O principal motivo, porém, que a Coca-Cola não vai dizer nunca, foi a permissão de entrada de bebida da Ambev na festa (guaraná Antárctica e cerveja Brahma). Os dirigentes dos bumbás e o comando da festa precisam entender que não dá para cobrar milhões de um anunciante e, na “hora H”, com todo mundo “liso”, pegar quanto puder de qualquer empresa, ainda que seja concorrente daquele cliente original. Isso não se faz. É ética elementar no mercado publicitário.

Aconteceu há alguns anos: a Vivo estava patrocinando o Festival. Deu determinado valor (não lembro quanto) para cada um dos bumbás e estava toda animada, pensando em investir mais no ano seguinte. De repente, eis que irrompe no Bumbódromo um astronauta, voando num veículo espacial, inserido na apresentação do pajé do Garantido. Trazia, na camisa se não me engano, uma propaganda da Amazônia Celular. Um dirigente estadual da Vivo chorou quando viu – acho que só de pensar nas explicações que precisaria dar à diretoria.

Outro fato, igualmente preocupante, é a decisão do Garantido de paralisar o trabalho de preparação para o Festival deste ano.

Acho uma atitude digna. Mais ainda se tiver ocorrido porque os dirigentes se recusaram a pagar agiota para receber adiantado o dinheiro de patrocínio.

Quase ninguém sabe, mas tem muito torcedor fanático, que chora quando vê o boi entrar na arena, se joga no chão, se descabela… e quando a diretoria se vê em apuros, com os artistas ameaçando entrar em greve, com salários atrasados, se apresenta para cobrir o rombo… Tira R$ 300 mil, R$ 400 mil ou mais do bolso sem nem piscar… E cobra 10% ou mais de juros ao mês. Sim, eu sei que a taxa do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic) está em 8,5% ao ano. Vá lá dizer isso para esses agiotas.

É por isso que, na década de 1990, o custo de cada bumbá girava em torno de US$ 300 mil (em torno de R$ 600 mil). Hoje, cada um recebe de R$ 6 milhões a R$ 7 milhões. E querem mais e mais e mais… E não vai ter dinheiro que chegue.

Anote aí o dinheiro que entrou nos bumbás, ano passado:

Coca-Cola – R$ 1,2 milhão

TV – R$ 1 milhão

Cerveja – R$ 500 mil

Ingressos – R$ 1,2 milhão

Governo do Estado – R$ 1,3 milhão

Bradesco – R$ 400 mil

Petrobras – R$ 500 mil

Volvo – R$ 150 mil

Mais outros anunciantes, com cotas de R$ 50 mil cada.

Os bumbás abrem mão de 40% do valor dos ingressos. É o dinheiro que fica para a Tucunaré Turismo porque ela adianta o valor dessa renda. Parece brincadeira, mas é assim.

O resultado são essas dívidas, trabalhistas ou não, que fizeram o Garantido perder e pagar uma grana para recuperar o curral histórico, que ensejou a famosa toada “Nunca mudou de fazenda/ nem de dono ou de curral…”

O Festival de Parintins precisa ser repensado. Pelo povo de Parintins e quem mais queira contribuir. Afastando a arrogância, o autoritarismo e o egocentrismo. Com mente aberta e sinceridade de propósitos. Tendo como princípio a humildade. Difícil? Pois foi assim que a festa chegou ao que é hoje, tendo, lá no comecinho, pescadores e estivadores responsáveis por suas fundações.

É hora de parar e repensar.

Veja também

9 comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Dodó Carvalho disse:

    Marcos, nossa festa precisa de um choque de ordem tanto econômica como cultural .

  2. thadeu seixas disse:

    Sou fã incondicional do Caprichoso e do festival, que frequento desde 1994. Portanto, me considero um pouco suspeito para comentar, mas vamos lá: após inúmeras tentativas cada vez mais me convenço da inviabilidade da transmissão televisiva integral da apresentação de cada bumbá. Mesmo para os aficcionados fanáticos como eu, a transmissão fica maçante e às vezes tediosa, aliado aos problemas técnicos e comentários totalmente descabidos. Dessa forma entendo perfeitamente a relutância das redes nacionais em promover a transmissão em tempo integral.
    Quanto ao relacionamento com os patrocinadores, concordo plenamente com voce, Marcos.Caso se concretize o rompimento com a Coca-Cola, acredito que o maior prejudicado será o próprio festival, os 2 bumbás e por consequência a população de Parintins e mesmo a de Manaus!
    A Coca-Cola levou o festival para o mundo todo, chegou ao cúmulo de mudar a cor de seu logotipo (heresia inimaginável)para se adaptar às regras do festival.Definitivamente ela merece um tratamento melhor. Nós temos muito mais a perder.

  3. Saulo Vasconcelos disse:

    Marcos,é muito dinheiro pra pouca festa apresentada pelos bois,o que precisa é de pessoas comprometidas com o profissionalismo,com a ética ,com a credibilidade e com a transparencia nos recursos repassados aos bois pois o que mais vemos hoje são pessoas comprometidas mais é com a vaidade e com seu bem estar pessoal e se esquecem que esta festa é do povo e para o povo pois nós (povo)é que somos peças fundamentais de nossa cultura e tradição popular

  4. Roberto disse:

    É por issso que quando vamos atras de ingressos, já se esgotaram com 2 dias de vendas é igual aos ingressos dos jogos do campeonato carioca, pq eles mesmos vendem p/ os cambistas…é uma palhaçada mesmo.

  5. arthur cezar ferreira e silva disse:

    É HORA DO TIRA-TEIMA. QUANDO A CULTURA É VERDADEIRA ELA INDEPENDE DOS PATROCINADORES PORQUE O QUE CONTA É A VONTADE DO POVO EM FAZER A FESTA, AFINAL SÃO 100 ANOS DE BOI., E 15 ANOS DE COCA-COLA. ISSO UM DIA IRIA ACONTECER PORQUE O PRÁ SEMPRE, SEMPRE ACABA. ADEMAIS, COCA-COLA COM SEU CAMAROTE DE CELEBRIDADES QUE NÃO DIVULGAM A NOSSA FESTA TIROU MUITO LUGAR DOS VERDADEIROS DONOS DA FESTA. FORA COCA-COLA E DEMAIS PATROCINADORES QUE ROUBARAM LUGAR DO POVÃO.,

  6. Roseane de Siqueira disse:

    Realemente, é um absurdo! Eu não faço a mínima questão que a Band continue transmitindo o festival, não é um produto de qualidade, eu mesma já chorei de raiva por não poder ouvir as toadas ou a lenda contada na arena devido os comentaristas falarem de mais, ou dos intervalos frequentes sem necessiadade. Mas realmente, em se tratando do patrocínio da coca…isso se perder por pura ganância…aí já é muita falta de respeito com nosso povo, com nosso festival que é o nosso maior tesouso cultural!

  7. maria jose disse:

    O festival de parintins atingiu um patamar muito acima de Manaus e de parintins, é agora uma festa nacional e mundial, precisa mesmo se profissionalizar e isso começa desde a diretoria extensivo a todos os colaboradores da festa. É impressionante como nao conseguimos administrar uma festa que é nossa e que ja provou que tem condição de se manter como uma atração de turismo e principalmente dá LUCRO a quem quer investir.

  8. Aderaldo Reis disse:

    Marcos faltou falar nos resultados arranjados que mancha a credibilidade do Festival Folclorico de Parintins. É preciso que determinado dirigente e diretores dos bumbás tenhanm compromnisso com a economica do Municipio. Do jeito que está, tem boi que vai pro bumbódromo caindo aos pedaços e “Ganha” o Festival Folclorico. Me poupe,

  9. Jose Travesso disse:

    Do jeito que vai, preparem as porongas p/ iluminar o terreiro,
    pois estamos regredindo.Incompetencia não se estabelece.