Propostas! Que propostas?

Se fosse possível fechar os olhos esquecer a realidade e apenas ouvir o que diz o “marketing político” todos os dias, a sensação seria de indescritível bem estar. Pela propaganda, você está morando numa excelente cidade no melhor país do mundo; trafega por impecáveis ruas dentro de coletivos novos e bem cuidados; ótimos hospitais cuidam da sua saúde e seus filhos frequentam escolas que serão excepcionais, para citar apenas algumas vantagens de uma extensa lista que são vendidas diariamente. São bilhões de reais empregados nessa armação ilusionista, que engana e acomoda.

Gasta-se muito dinheiro para anunciar o que foi ou está sendo feito e, nos últimos anos, inventaram a publicidade da “intenção de fazer”. Não interessa se vai ou não acontecer, o importante é “fazer o comercial” e iludir o povão.  Caríssimas e bem elaboradas campanhas procuram transmitir a ideia de movimento. Fica a percepção de trabalho e mesmo que nada se esteja fazendo, acontece o ganho político, é claro. Pura estratégia de permanência no poder.

País algum, minimamente civilizado, permitiria um descalabro dessa magnitude. As estimativas são de que, nos últimos dez anos, foram gastos cerca de R$ 20 bilhões nos três entes federativos com essa farra. Qualquer miserável município brasileiro tem no seu orçamento percentual considerável para comunicação. Dinheiro tirado do nosso bolso por uma escandalosa carga tributária, sem nada acrescentar à sociedade.

É evidente que, com um volume de recursos dessa natureza, fica fácil construir mitos e conquistar mentes e corações, além da vantagem de sobrar um troco.  E, convenhamos, qualquer troco de R$ 20 bi é uma soma fenomenal. Vide o “mensalão”.

Já nas eleições, aliados e adversários, cada um com sua particular retórica do imponderável, tentam construir um ilusório mundo novo. São propostas (se é que podem ser classificadas como tal) de baixa credibilidade. Salvo poucas exceções, a grande maioria não subiria o primeiro degrau no campo da razoabilidade, carregadas que são de ingenuidade ou má fé.

Veja-se, por exemplo, as propostas para a educação, onde a escola de tempo integral, distribuição de computadores e a construção de creches farão milagres. São bons programas, mas, frente às circunstancias, mostram dificuldades em produzir resultados aceitáveis.

Da escola de tempo integral, já escrevi em outra ocasião. Ela só tem sentido se for massificada dentro de um prazo razoável, premissa incapaz de ser atendida. Não temos esse dinheiro. E não adianta apelar para essa absurda figura chamada “ação conjunta”, pois o Brasil, também, não o tem. Aliás, disseminar essa figura é reduzir o país a uma republiqueta de bananas, sem qualquer princípio ético, na qual me recuso a acreditar.

Os que defendem a implantação dessas escolas têm um argumento irrefutável: nelas os alunos apresentam desempenho acima da média. É verdade, mas é, também, um engano. O mérito é mais do aluno do que da escola, por uma simples razão: as vagas são limitadas o que força a admissão por testes e, é claro, são escolhidos os melhores. Ou seja, os bons resultados já eram conseguidos por eles nas suas escolas de origem, que podem ser, inclusive, da esfera particular. No conjunto não houve melhoria.

É fato que essa é a forma adotada na maioria do mundo desenvolvido, o que certamente determinou o seu avanço, a ponto de estabelecer uma dianteira sobre nós, de pelo menos 30 anos. Diferença que queremos tirar com a mesma fórmula. Seria razoável ouvir o que dizem os gurus do marketing: “Saindo atrás você nunca vai alcançar ou superar o seu competidor usando a mesma estratégia”.

Estou convencido que somente uma revolução de atitudes e procedimentos pode melhorar a educação brasileira dentro da urgência requerida.  A corrida é contra o tempo e a escola de tempo integral não parece o veículo mais adequado. Os nossos jovens, cada vez com mais frequência, terão que competir com os seus iguais de outros países e só terão chances com bom preparo. Há outras soluções mais baratas e mais rápidas. Algumas delas muito claras, mas não se quer enxergar.

Já sobre a distribuição de computador para alunos do sexto ano, parece-me uma inversão de prioridade. Não tem sentido distribuir essa ferramenta, pois, para usá-la é pré-condição saber ler e escrever e mais de 50% desses alunos deixam o 5º ano sem essa condição.  Como vão usar o computador?

As creches foram vedetes nas campanhas de 2008 e 2010, quando candidatos prometeram construir milhares de unidades o que não se materializou. Voltam agora com a mesma força, pois, certamente, os eleitores já esqueceram o passado.

De qualquer modo é bom pensar que educação infantil vai muito além da construção de prédios. Exige ser tocada por profissionais muito bem preparados, afinal vão tratar com seres dando os primeiros passos na formação humana. Ficar apenas no espaço físico sem levar em conta o preparo dos recursos humanos, o que sequer se ouve falar, é condenar a creche a mero depósito de crianças.

O fato é que proposta não é o forte de campanhas eleitorais. E nunca haverá mudanças sem uma reforma política/eleitoral, perspectiva pouco provável. O momento político é muito superficial e não é feito de propostas, mas de venda de ilusões, descomposturas, calúnias e difamações. É o que vale e conquista. Mesmo os mais sérios (e não são muitos), pela própria sobrevivência política, constroem seus castelos de areia. E neste ano, até o TSE, com nosso dinheiro, também construiu o seu: recomenda votar em candidatos que tenham boas propostas. “Propostas! Que propostas?”

Francisco Cruz

Francisco Cruz

* Francisco R. Cruz é empresário e trabalhou muitos anos na área de tecnologia e, entre 2001 e 20...

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2 comentários

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  1. thadeu seixas disse:

    Finalmente alguém levanta a questão do gasto exorbitante e totalmente desnecessário das verbas publicitárias pelo governo, em seus três níveis.
    Infelizmente, por motivos óbvios, nenhum órgão da imprensa jamais irá repercutir esse problema, pois todos se beneficiam dessa enxurrada de recursos públicos.

    1. Francisco C R Cruz disse:

      Pregador Tadeu,
      Obrigado pelo comentário. Vc identificou bem a dificuldade para mudar a situação. Parabéns.