Destino

Na eleição presidencial de 1960, o Marechal Henrique Lott que, cinco anos antes, impedira golpe militar contra a posse do Presidente constitucional Juscelino Kubitschek, enfrentou o carismático Jânio Quadros. Naquela época, a Vice-Presidência era disputada no voto também, diferentemente de hoje, em que faz parte da chapa do candidato principal.

O Vice de Lott era João Goulart, que pretendia manter-se no posto que ocupava desde o governo JK. O de Jânio era o culto udenista mineiro Milton Campos. Como Jânio, eficiente orador de comícios, se notabilizava pelo populismo caricato, logo se desenhou sua vitória. Do mesmo modo, ficava patente que Jango derrotaria Milton. Percebendo a tendência, aliados tanto de Jânio quanto de Jango fizeram entendimento subterrâneo, uns traindo Lott e outros traindo Campos, através da chapa “Jan-Jan”, que pegou como rastilho de pólvora. Jânio foi eleito com mais de seis milhões de votos e Jango reconduzido à Vice, com cerca de quatro milhões e meio de sufrágios.

Dos candidatos a governador daquele pleito apenas Tancredo Neves, com sua proverbial lealdade a princípios, causas e companheiros, foi leal a Lott. Perdeu, então, o governo de Minas para Magalhães Pinto, que se escorou na popularidade de Quadros.

Jânio tomou posse em janeiro de 61 e, por razões até hoje não completamente explicadas, renunciou ao mandato seis meses depois. Os Ministros militares vetaram a posse de Jango e se iniciou uma grande luta no Congresso e fora dele, para fazer valer a letra da Constituição. Leonel Brizola, governador do Rio Grande, comandou a Cadeia da Legalidade, anunciando que resistiria ao golpe de armas na mão.

Goulart terminou sendo empossado, sob três condicionantes: nomear o banqueiro Walter Moreira Salles, figura de confiança do capital internacional, para a Embaixada em Washington, instituir o parlamentarismo e, vejam os leitores a força do destino, indicar Tancredo, cujo nome avalizaria a estabilidade política, para Primeiro Ministro.

Derrotado por Magalhães em outubro de 60, Tancredo virava Chefe de Governo em setembro de 61. Os “amigos” voltaram pressurosos. “Lealdades” quebradas foram restabelecidas.

Digo isso a propósito da eleição do Desembargador Ari Moutinho para presidir o Tribunal de Justiça. Passou por duro questionamento no Conselho Nacional de Justiça. Parecia inviabilizado para pretender qualquer posto de comando na Corte. Pois venceu sua destemida adversária e chegou ao ponto culminante da carreira.

Ari, que passou por humilhações em seu calvário recente, saberá exercitar a humildade que caracteriza os fortes. A começar, como ele mesmo anuncia, pela relação construtiva e aberta com a Desembargadora Graça Figueiredo.

Afinal, a disputa passou e o destino, mais uma vez, ofereceu, a todos nós, um exemplo e uma lição.

Arthur Virgílio Neto

Arthur Virgílio Neto

* Arthur Virgílio Neto é diplomata, ex-líder do PSDB no Senado e prefeito de Manaus

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