Faculdade Católica do AM traz amazonense do Vaticano para aula inaugural. Veja entrevista

Faculdade Católica

Faculdade Católica trouxe padre Adelson Santos, único brasileiro na mais prestigiada universidade católica do mundo, em Roma. Na foto, em frente à Catedral de São Pedro, em Roma

O padre Adelson Santos, 58 anos, professor na Pontifícia Universidade Gregoriana (PUG), em Roma, fará a aula inaugural da Universidade Católica do Amazonas. A ex-reitora da UEA Marilene Correa é a outra professora convidada do evento, que ocorrerá no dia 06/02. A PUG é considerada o centro de ensino mais tradicional e de maior renome da Igreja Católica.

Passaram pela PUG 15 papas e incontável número de cardeais, bispos, santos etc. Fundada em 1551, por Santo Inácio de Loiola, ela é considerada “a Harvard para os católicos”, como diz o padre Adelson. “Está centralizada na Teologia, com cursos em Filosofia, Psicologia, Comunicação, Direito Canônico, Missiologia etc. “Trabalho na área da Teologia Espiritual e sou diretor do centro de formação dos formadores para seminários, o Instituto São Pedro Fabro”, acrescenta.

Adelson, autor do livro “Amazônia, um lugar teológico”, sobre o Sínodo da Amazônia, nasceu em Manaus, viveu os primeiros anos em Parintins e está em Roma desde 2018. Ele participou, recentemente, dos funerais do Papa Bento XVI e concelebrou a missa fúnebre, na Basílica de São Pedro.

Em Manaus, num intervalo entre o fim do 1º Semestre acadêmico e o início do 2º semestre, além da aula inaugural da Universidade Católica do Amazonas, vai comemorar os 25 anos de ordenação sacerdotal. “Fui ordenado no dia 27/12/1997, por Dom Luís Soares Vieira. Como estava em aula, em Roma, vou comemorar com uma missa, um mês depois (27/01), no mesmo local da ordenação”, revela. Padre Adelson falou ao Portal do Marcos Santos:

www.portalmarcossantos.com.br – Quais são, hoje, os grandes temas da Igreja? O que, nessa sua convivência em Roma, o senhor diria que é a maior preocupação do momento para a cúpula católica?

Padre Adelson Santos – É mais minha experiência pessoal, a partir das áreas às quais mais me dedico. Trabalho em toda a reflexão do Papa Francisco, para que a igreja seja mais sinodal. Há toda uma teologia sobre o que vem a ser isso, qual a espiritualidade que acompanha esse desejo do Papa atual. Ele convocou um sínodo para 2024 e eu me concentro muito nisso. Sou chamado a falar disso, assessorar, dar cursos. Pelo fato de ser da Amazônia (é o único brasileiro na PUG) e ter trabalhado como perito num sínodo, me concentro no diálogo da Teologia, cosmovisões e espiritualidade cristã dos povos originários da Amazônia. Faço um diálogo entre Teologia e Ecologia, dando origem à Ecoteologia, que tem muito a dizer para nossa região, sobretudo. São as áreas às quais tenho me concentrado. Mas também sobre a reflexão de como formar um futuro sacerdote, um futuro religioso. Que formação humana, acadêmica, pastoral, espiritual, antenada com o mundo de hoje, ele pode ter, sem perder suas raízes, a centralidade na pessoa de Jesus Cristo? Ao mesmo tempo, possibilitando formação de sacerdotes que saibam dialogar com o mundo, com as outras culturas, com as ciências, as outras religiões. Também procuro considerar, hoje, a companhia e reflexão, com nossos estudantes, dos grandes desafios da igreja, das fragilidades, escândalos, abusos… Trabalhando isso desde a formação, para que o jovem se conheça, tenha bom nível de autoconhecimento, para entender fortalezas e fragilidades humanas e espirituais. Para enfrentar e viver nesse mundo, que não é mais uma sociedade da cristandade, nem se vive dentro de uma bolha. A igreja que o Papa nos chama é “em saída”, que vai ao encontro do outro e não que fica dentro da sacristia, como ele diz.

 

pms.am – Viver em Roma, muito próximo do centro de decisão da Igreja Católica, tem implicações políticas. Como é essa experiência?

Padre Adelson – Por um lado, é uma experiência rica, enriquecedora, por todo esse aspecto de estar no centro do poder e de referência, para os cristãos católicos do mundo inteiro. Ali está o sucessor de Pedro, o Papa. Tem toda essa riqueza, com a qual a gente aprende continuamente a lidar e usufruir, para nossa própria formação. E aprendendo a não cair nos riscos que existem. O Papa Francisco sempre lembra que o objetivo da Cúria, e dos trabalhadores próximos, como a universidade onde leciono, é ser meio de evangelização. É favorecer que o Reino de Deus possa chegar a todas as pessoas. O sistema é combatedor de toda forma de carreirismo, das pessoas que tentam estar lá pelo cargo que ocupam. Temos que dar um testemunho de que é assim como o Papa fala, para quem nos vê, os estudantes e outros religiosos que passam por Roma. Que não seja uma igreja monárquica, uma corte, onde as pessoas sejam bajuladas. Somos servidores da igreja, que, por sua vez, é servidora da missão de Cristo.

 

pms.am – Conservar as raízes, nesse envolvimento com a Cidade Eterna e o Vaticano, é um desafio e tanto.

Padre Adelson – Acho importantíssimo que quem está em Roma, no centro de poder da igreja católica, procure conservar suas raízes, o contato com a igreja de origem. Sobretudo nós, do Terceiro Mundo. Procuro sempre não perder esse contato e tenho ajudado muito, a partir do Sínodo da Amazônia, com a observação da vida missionária na Amazônia.

 

pms.am – O senhor ministrará, ao lado da ex-reitora da UEA Marilene Corrêa, a aula inaugural da Faculdade Católica do Amazonas. Como será?

Padre Adelson – Estamos dialogando com a direção, em Manaus, para parceria com a PUG. Eu dizia, ontem (16/01), que é um ganho para as duas partes. Levar nossa realidade para dentro da universidade, em Roma, é uma riqueza para quem está lá. Vamos ter contato com equipes itinerantes, missionários que andam pelos rios da Amazônia. Isso é algo que procuro fazer. É isso que nos dá condições de que nossa reflexão seja encarnada, ouvindo nosso povo, que, muitas vezes, vive à margem do que deveria ser um direito básico. A gente precisa contextualizar nossa realidade em rostos concretos, como foi a missão de Jesus. Ele percebeu muita coisa, da realidade que o envolvia, como se traduz nas palavras e nos gestos dele.

pms.am – É possível perceber, no Vaticano, os ecos do recente processo eleitoral no Brasil? A cúpula da igreja entende essa coloração ideológica que marcou o processo e os exageros em torno dele?

Padre Adelson – Acredito que o Vaticano, em si, é uma constelação. É complexo de dizer quem no Vaticano viu isso. Me concentro no Papa e ele, sim, busca estar sempre bem informado do que acontece no mundo. Ele acompanha com atenção e preocupação a situação dos países da América Latina. Assim como ele sempre fala na Ucrânia, recentemente falou do Peru e do Brasil, logo após os atos de vandalismo que ocorreram em Brasília. Ele rezou pelo Brasil, pedindo paz e o fim dos conflitos. Tem muita informação, por causa do contato com a CNBB. Não toma partido ideológico, mas sempre é a favor da paz, diálogo, justiça, verdade, ética… Ele sabe que nós somos vítimas de ondas de notícias falsas, de guerras de fake News. Já fez referência a isso. É o modo como busca ser uma luz de orientação aos católicos. Pena que nem todos se preocupam em olhar e ver qual é a posição que o Papa está tomando. É muito fácil cair em polarizações e encontrar quem vai defender esta ou aquela visão mais radical.

 

pms.am – O Amazonas foi informado, recentemente, da escolha do bispo diocesano de Parintins. Como se percebe esse processo, na cúpula da igreja?

Padre Adelson – Nós, que estamos na missão universitária, não temos acesso. Não é algo que esteja próximo das nossas atribuições. O processo de substituição se dá quando o bispo chega aos 75 anos. Ele, como prevê o Direito Canônico, oferece a renúncia e o Papa aceita ou não. Às vezes demora para aceitar, porque tem dificuldade para nomear outro. Há um processo de consulta aos núncios apostólicos, que representam o Papa em cada país, e aí aparecem os nomes. Tudo isso se transforma em um dossiê enviado a Roma e o Papa toma sua decisão, escolhendo o próximo bispo da Diocese. Foi daí que surgiu o nome do novo bispo, muito conhecido de nós, manauaras, porque era bispo-auxiliar de Manaus, foi reitor do seminário. Foi padre Zezinho, depois Dom José Albuquerque e agora ganha sua própria Diocese. É um processo natural, dos bispos-auxiliares.

 

pms.am – O senhor o conhece? Qual sua impressão?

Padre Adelson – Conheço. Fico feliz. É o primeiro bispo amazonense a assumir a Diocese de Parintins. Até então os bispos eram do Pime (Pontifício Instituto para as Missões Estrangeiras, de Milão, Itália), a maioria italiana. É motivo de alegria. Conheço pessoalmente e tenho até dificuldade de chama-lo de “Dom José” (risos). A gente se acostumou a chamar de “Padre Zezinho”. Nossas dioceses são missionárias, com vasta área geográfica. Bispo precisa ter saúde, boa formação teológica, boa espiritualidade e que seja um “pastor com cheiro das ovelhas”, como diz o Papa.

 

pms.am – Explique para nós as razões da sua viagem a Manaus?

Padre Adelson – É um intervalo entre o 1º semestre acadêmico, que encerrou agora, e o início do 2º semestre, que inicia na segunda metade de fevereiro. Aproveitei para o contato com a universidade porque fui convidado para a aula inaugural, dia 06/02, ao lado da professora Marilene Correa. E para comemorar os 25 anos de vida sacerdotal. Fui ordenado na Catedral de Manaus, no dia 27 de dezembro de 1997. Estava em aula e vou celebrar um mês depois, 27 de janeiro, na mesma catedral, com amigos, padres, família. Esse é o outro motivo. A Faculdade Católica do Amazonas é iniciativa de Dom Leonardo Ulrich Steiner, arcebispo de Manaus, sucedendo o Centro de Estudo do Comportamento Humano (Cenesc) e o Instituto de Teologia Pastoral e Ensino Superior da Amazônia (Itepes). Terá reconhecimento do MEC e do Vaticano, com ênfase em Teologia e Filosofia.

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