Luiz Bacellar, um poeta nacional escondido na Amazônia, vira livro de Elson Farias

Luiz Bacellar

Luiz Bacellar (em pé) recebe autógrafo de Elson Farias, quando este lançou livro sobre o maestro Cláudio Santoro. Foto: reprodução livro “Luiz Bacellar e sua poesia”

Um poeta amazonense, que viveu e morreu em Manaus, mas tinha uma obra robusta, capaz de lhe garantir projeção nacional. Luiz Franco de Sá Bacellar, nascido em 04/09/1928 e falecido em 09/09/2012, optou pela vida na terrinha. Mas ganhou o Prêmio Olavo Bilac (1959), da Prefeitura do antigo Distrito Federal, no Rio de Janeiro. O júri era composto por nomes como Carlos Drummond de Andrade e Manoel Bandeira. Também fez um curso de extensão universitária, “Pesquisa social”, tendo Darcy Ribeiro como mentor. “Era um poeta nacional, escondido na Amazônia. Ele podia ter a projeção desses grandes nomes, mas optou por Manaus”, diz o contemporâneo Elson Farias.

Quer mais? O poema “Papagaio de papel”, do livro “Sol de feira”, foi traduzido por ninguém menos que Pablo Neruda. “Quem o conhecia sabia que ele não era um poeta comum”, acentua Elson.

Dia 09/09, data em que o poeta completa 8 anos de falecimento, Elson Farias lança o livro “Luiz Bacellar e sua poesia”. Foi editado pela Livraria Valer. E o Instituto Cultural Brasil-Estados Unidos (Icbeu) participa do lançamento, que ocorrerá às 18h30, daquele dia, na galeria do Icbeu, na avenida Joaquim Nabuco, 1286, Centro.

“O conheci desde que cheguei a Manaus. Sempre frequentou minha casa. Trato (no livro) da parte biográfica, superficialmente, e do estudo da poesia dele. É uma leitura da obra, com o objetivo de ajudar o leitor”, diz Elson.

“Hoje, a poesia é estudada nos cursos de letras como ‘Ciência literária’. Não é disso que trato. Vejo a poesia como ‘fenômeno linguístico’. No caso dele, um fenômeno da língua portuguesa. O período renascentista teve muita influência. É isso que abordo”, acrescenta o autor.

Sobre o chamado “lado hermético da poesia”, Elson Farias compreende e explica. “A poesia é escrita através de metáforas, que escondem muito a realidade. Eça de Queiróz dizia que ‘a literatura se faz pela face crua da realidade, sob o manto diáfano da fantasia’. Claro que Bacellar falou muito sobre Manaus, abordando a cidade. ‘Sol de feira’, por exemplo, é um livro sobre frutos da Amazônia, pupunha, açaí, manga etc.”, explica.

 

Amigos próximos

Elson, poeta, escritor, ensaísta, contista e jornalista, foi um dos amigos mais próximos de Bacellar. A mãe do poeta homenageado, dona Maria de Lourdes Franco de Sá, era irmã do sogro dele, o médico oftalmologista Franco de Sá.

Excêntrico, poucos amigos, Bacellar foi interno no prestigiado Colégio São Bento-SP. Depois fez a extensão universitária, “Pesquisa social”, com o ministro da Educação de João Goulart, Darcy Ribeiro. E se dedicou à literatura, em Manaus.

Foi um dos fundadores e quem deu o nome ao “Clube da madrugada”. “Literatura, cultura, poesia eram a vida dele. Exerceu algumas funções, sendo a mais relevante, a de conselheiro de Cultura do Estado. No jornalismo era revisor e deu aulas no Ensino Médio. Era muito amigo do jornalista Umberto Calderaro. A Editora Calderaro, aliás, foi responsável pelo lançamento do livro ‘Sol de Feira'”, conta Elson.

 

‘Frauta de barro’

O poema mais famoso é “Balada da rua da conceição”, contido no livro de estreia dele, “Frauta de barro”. Foi esse livro que ganhou o prêmio nacional de poesia, oferecido pela Prefeitura do antigo Distrito Federal, no Rio de Janeiro. Além de Drummond e Bandeira, outro poeta, muito conhecido na época, José Paulo Moreira da Fonseca, compôs o júri.

Cinco anos depois, Bacellar lançou o “Frauta de barro” pela editora São José, do Rio de Janeiro.

“Tinha ainda o  ‘Crisântemo de cem pétalas’, de haikais, feito em associação com Roberto Evangelista, e o livro de poemas chamado ‘Sol de feira’. E, finalmente, “Quarteto”, o último que lançou. Tinha também vários poemas inéditos, agora reunidos nesse livro novo, lançado pela Valer”, diz Elson Farias.

“Quarteto” teve umas duas outras edições, chamadas de “Quatro movimentos”. “Ele costumava trabalhar muito em cima de sua obra e mudava nomes”, diz o autor do livro.

“Quarteto”, aliás, é considerado por Elson como o mais complexo, do ponto de vista do leitor, da obra de Bacellar. “Ele sai um pouco da vida urbana, da cidade, da vida na floresta, para temas dos sonhos, da solidão e do amor. Aí fica mais complexa a leitura, embora sem perder a beleza. O que ajuda o leitor é que a poesia dele é muito bem feita, muito bonita, sobretudo no soneto, forma que domina a obra dele. Era um mestre do verso. Isso ajuda muito o leitor”, diz.

Mestre? Sim. Na métrica, ritmo, rima e conteúdo. “Fernando Pessoa afirma que ‘O poeta é um fingidor. Finge tão completamente, que chega a fingir a dor que deveras sente’. Quando perguntam aos poetas porque escrevem dizem que é ‘para mudar a vida do povo’ ou ‘amar e ser amados’. Luiz Bacellar dizia que escrevia ‘para divertir o leitor’. Usava, por isso, uma linguagem, o quanto possível, de fácil acesso. Às vezes, ele tem um vocabulário um pouco mais precioso, mas nota-se o esforço para atingir o maior número possível de leitores”, analisa.

A consagração de Luiz Bacellar ficou aquém do talento e da obra dele? “Sim. No Brasil, todos só pensam Rio, São Paulo e, às vezes, Minas. É por isso que os bons artistas vão para São Paulo ou Rio. Como Luiz viveu aqui, não teve expressão. É uma realidade sociológica. Se tivesse ficado no RJ teria sido projetado como um Drummond ou um Bandeira, talvez”, pondera.

“Hoje, com a Internet, ele é conhecido um pouco mais. A Valer trabalha com a Amazon, publicou as obras completas de Bacellar e os livros estão aparecendo. Tenho um agente, no Rio de Janeiro, que já mandou mensagem dizendo que recebeu o convite e já sabe do livro que estou lançando. Isso é resultado da Internet”, constata Elson.

 

Poeta e escritor desde os 15 anos

Élcio Farias, 84, nascido em Itacoatiara, começou a escrever aos 15 anos, em Parintins, onde viveu parte da vida. Criou um grêmio literário chamado Castro Alves. Tinha um jornalzinho, que divulgava no mercado municipal, chamado “A flama”. Aí publicou dois poemas. Depois foi criado um centro cultural, semente da atual Academia de Letras de Parintins, que publicou uma revista, “Parintins ilustrada”, onde tem dois poemas, a estreia literária dele.

Segunda geração do Clube da Madrugada, Elson entrou na Academia Amazonense de Letras (AAL) aos 33 anos, quando Djalma Batista era presidente. Ano passado comemorou o Jubileu de Ouro, por 50 anos na casa. A ideia era renovar e levar os poetas do Clube da Madrugada. Luiz Bacellar também era da AAL, como Jorge Tuffic, Alencar e Silva, Anísio Melo e outros.

Elson é membro do Igha e foi presidente da AAL por dois mandatos. Foi diretor de Cultura, superintendente da Fundação Cultural e secretário de Estado da Educação e Cultura, no governo Danilo Areosa. Mais tarde, no governo José Lindoso, criou e foi o primeiro secretário estadual de Comunicação Social (Secom).

Veja também
Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *