
Com apoio da Funarte, série de podcast mostra a diversidade musical da Amazônia
Embarcando pelos rios da Amazônia, o DJ, pesquisador e produtor cultural Zek Picoteiro lançou a primeira temporada da série de podcast Afluentes, um mergulho profundo nos sons que nascem, resistem e se reinventam nas margens dos afluentes amazônicos. O projeto foi contemplado pelo Programa Funarte Retomada 2023, com apoio do Ministério da Cultura.
O pesquisador percorreu os rios Amazonas, Tapajós, Guamá e Jari, e também comunidades ribeirinhas e quilombolas, para entender, mapear e registrar ritmos tradicionais e regionais. Ao total, são seis episódios – dois deles já disponíveis -, dedicados a diferentes gêneros musicais: Beiradão, Tecnobrega, Carimbó, Boi Bumbá, Lambada e o Marabaixo.
“O projeto nasceu da minha necessidade, como DJ, de catalogar a diversa música amazônica. A concepção veio ao perceber que o rio é o elemento que conecta todos os gêneros musicais da região, servindo como uma rota para a sua disseminação. O podcast busca mapear esses fluxos”, conta o pesquisador cultural.
Iniciativa
A iniciativa tenta ainda com um site interativo que mapeia a bacia amazônica, reunindo saberes, artistas, movimentos culturais da região amazônica, além de um mapa interativo, artigos, diários de bordo das viagens, playlists e sets mixados.
Zek analisa que os rios influenciam diretamente a forma como os amazônidas produzem e consomem música, pois é a partir deles que se organiza a logística de turnês para artistas e aparelhagens, que enfrentam desafios únicos para transportar toneladas de equipamentos em balsas.
Ouça os dois primeiros episódios
“A música também é consumida durante as longas viagens de barco, tornando-se a trilha sonora que conecta as comunidades ribeirinhas”, completa.
Episódios: do Beiradão ao Tecnobrega
O episódio de estreia da temporada apresenta um gênero musical nascido na beira do Rio Amazonas: o Beiradão, que aborda as suas raízes ribeirinhas e a influência do saxofone. O episódio ainda descreve a paisagem do Beiradão e festas tradicionais como a Festa do Mamão. Há também uma perspectiva histórica e social, ligando a música aos fluxos migratórios e à exploração da borracha.
Já o segundo episódio tem como foco o Tecnobrega, música eletrônica que emerge das periferias da Amazônia, um ritmo que nasceu nas aparelhagens e conquistou os rios da região. O episódio ainda explica como o Brega se espalhou pelas comunidades ribeirinhas, criando uma forte ligação entre a periferia e o interior, por fim, convida a conhecer a história e os artistas que fazem do Tecnobrega um fenômeno único.
Território como fonte sonora e de pesquisa
Afluentes ainda se propõe a pesquisar e documentar, a partir da escuta e da oralidade, saberes transmitidos entre gerações. Com uma linguagem sensível e um cuidado sonoro que respeita os tempos da fala e da natureza, o podcast articula um formato digital contemporâneo com os fundamentos da tradição oral.
A pesquisa também se aprofunda na investigação das condições climáticas e socioambientais únicas que fazem da região amazônica um celeiro musical, com uma diversa gama de gêneros e subgêneros baseados no percurso dos seus rios.
“Acredito muito no uso da tecnologia para criação e também na disseminação de múltiplas narrativas através de plataformas digitais. Esse formato de podcast tem sido muito importante para compartilhar o nosso ponto de vista amazônico sobre a nossa cultura”, avalia o artista.
Pesquisador e DJ
O pesquisador e DJ espera que o projeto contribua para a valorização da cultura ribeirinha e quilombola e também para combater o preconceito contra gêneros como o tecnobrega, mostrando-o como um autêntico e poderoso movimento cultural.
“O projeto amplifica a voz dos próprios criadores e busca visibilizar outras manifestações, como a cultura afro-amapaense do Marabaixo, que é uma forma de compreender a construção da identidade cultural preta da Amazônia”, avalia Zek.
Descentralização cultural
A iniciativa foi contemplada pelo Programa Funarte Retomada 2023 – Música, com apoio do Ministério da Cultura e produção do Instituto Regatão Amazônia . O chamamento é um conjunto de editais para as áreas de circo, dança, teatro, música e artes visuais. Os cinco processos de seleção tiveram destinação total de R$ 23,4 milhões.
Para o pesquisador, editais públicos são uma linha de vida para projetos, principalmente na região no norte, onde os custos logísticos são altos e o acesso a investimentos é escasso.
“Eu consegui realizar expedições fluviais reais que nunca teria condições de fazer com recursos próprios. Além de possibilitar a descentralização da produção cultural e permitir que a Amazônia conte suas próprias histórias”, conta.
Fundação
A presidenta da Fundação Nacional de Artes (Funarte) , Maria Marighella (foto acima), também destaca a importância da diversidade da música brasileira e da promoção de políticas públicas para o setor.
“A música brasileira e sua diversidade é uma riqueza do nosso país. Iniciativas como essa articulam criação, pesquisa e reflexão no desenvolvimento dessa que é a linguagem mais popular das artes brasileiras, a nossa música, e neste caso envolvendo diferentes ritmos e sonoridades produzidas por comunidades ribeirinhas da região Amazônica”.
E acrescenta, “desde 2023, temos formulado programas que pudessem estar de mãos dadas com quem tece a rede produtiva das artes e promove o acesso da população aos bens artísticos e culturais em todas as regiões do Brasil. O Programa Funarte Retomada foi um movimento inicial que respondeu a um setor artístico com demandas altamente represadas do último ciclo, e que também gerou dados fundamentais para a pesquisa que realizamos sobre o Fomento às Artes no Brasil e, por consequência, para o amadurecimento de políticas públicas com foco nas vocações de cada ente, sem sombreamentos e estimulando o pacto federativo. É o que estamos realizando e avançando agora mesmo com as diretrizes da Política Nacional das Artes.”
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