MPF pede suspensão do leilão de 47 blocos de petróleo na foz do Amazonas

MPF pede suspensão do leilão de 47 blocos de petróleo na foz do Amazonas

Exploração de petróleo em desacordo com a legislação gera graves riscos socioambientais e viola compromissos climáticos (Foto: Anan Kaewkhammul/Canva)

O Ministério Público Federal (MPF) recomendou que a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) suspenda imediatamente o leilão da 5ª Oferta Permanente de Concessão (OPC), previsto para 17 de junho, ou exclua do leilão os 47 blocos petrolíferos localizados na bacia da foz do Rio Amazonas. A recomendação foi expedida nesta segunda-feira (26), com prazo de 72 horas para que a ANP comunique a adoção das medidas.

O MPF aponta que a decisão de expandir a fronteira de exploração petrolífera no Brasil, especialmente na foz do Amazonas, representa um grave contrassenso aos esforços globais de descarbonização e aos compromissos climáticos do país, que se prepara para sediar a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 30).

A recomendação ressalta que os 47 blocos são reofertas de áreas não arrematadas na 11ª Rodada de Licitação (2013-2014) e que, mesmo após mais de dez anos, nenhum dos blocos então arrematados na bacia obteve licença de operação.

O MPF cita, ainda, o indeferimento de licenças ambientais pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para blocos na região devido à dificuldade das empresas em demonstrar capacidade de resposta a emergências de vazamento de óleo e apresentar programas ambientais adequados às especificidades amazônicas.

Falta de estudos e consultas

O MPF aponta, também, a necessidade da Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS), que ainda não foi realizada para a bacia da foz do Amazonas e para a bacia Pará-Maranhão, apesar de ambas serem áreas ambientalmente sensíveis e pouco estudadas. De forma contraditória, a falta de estudos estratégicos como a AAAS levou à exclusão de todos os blocos da bacia Pará-Maranhão, mas não dos blocos da foz do Amazonas, ressalta o MPF.

A recomendação enfatiza a necessidade do cumprimento da Consulta Prévia, Livre e Informada (CPLI) aos povos indígenas e demais comunidades tradicionais, conforme a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A ausência de previsão de CPLI nos modelos de contrato da ANP é apontada pelo MPF como falha grave.

O MPF sustenta que a CPLI deve ocorrer na fase de planejamento, antes de qualquer medida relacionada à licitação, e abranger os impactos socioambientais em toda a área dos projetos, não apenas bloco a bloco ou na fase de perfuração.

Por fim, o MPF destaca a necessidade de um estudo de impacto climático antes da concessão, conforme a Política Nacional sobre Mudança do Clima e o Enunciado 31 do Conselho da Justiça Federal, dado que a operação de múltiplos blocos gera efeitos cumulativos e sinérgicos que aumentam a pressão sobre o clima.

Detalhes da recomendação

Além da suspensão do leilão ou exclusão dos 47 blocos, o MPF recomenda que a ANP realize:

  • AAAS para a bacia da foz do Amazonas;
  • CPLI durante a fase de planejamento e, consequentemente, antes de qualquer medida relacionada à licitação;
  • estudo técnico de viabilidade econômica, social e ambiental, considerando aspectos humanos, históricos, arqueológicos e ambientais, dentre outros;
  • estudos de impactos a indígenas, a quilombolas e a demais povos e comunidades tradicionais, avaliando impactos socioambientais em toda a área dos projetos na bacia e não apenas na fase de perfuração e muito menos analisando apenas um bloco de cada vez; e
  • estudo de impacto climático antes da concessão.

Compromissos sob risco

Além da Convenção nº 169 da OIT, o MPF ressalta que outros compromissos internacionais assumidos pelo Brasil podem ser violados pela exploração de petróleo na foz do Amazonas em desacordo com a legislação. Entre esses outros compromissos estão a Convenção sobre Diversidade Biológica, a Convenção Ramsar sobre Zonas Úmidas, a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e o Acordo de Paris. Este último, segundo o MPF, possui status de norma supralegal e visa limitar o aumento da temperatura global, o que contrasta com a expansão da exploração de petróleo.

Sobre recomendações

Recomendação é um instrumento por meio do qual o Ministério Público expõe, em ato formal, fatos e fundamentos jurídicos sobre determinada questão, com o objetivo de fazer com que o destinatário pratique ou deixe de praticar condutas ou atos para melhoria dos serviços públicos e de relevância pública ou do respeito aos interesses, direitos e bens defendidos pela instituição.

É uma atuação voltada para prevenção de responsabilidades ou correção de condutas. Embora não possua caráter obrigatório, visa a solução do problema de forma extrajudicial. O não acatamento infundado de uma recomendação – ou a insuficiência dos fundamentos apresentados para não acatá-la total ou parcialmente – pode levar o Ministério Público a adotar medidas cabíveis, incluindo ações judiciais cíveis e penais contra os agentes públicos responsáveis.

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