
Arnaldo Santos, o narrador esportivo que marcou gerações, parte deixado legado humano e de amizade difícil de igular
“Alô torcida brasileira”, a saudação inicial, e “o tempo é tudo e marca”, a cada cinco minutos das partidas, bordões que Arnaldo Santos levou pela vida inteira, ainda ecoam nos meus ouvidos. Trabalhamos juntos, de 1983 aos anos 1990, nas rádios Rio Mar e Ajuricaba. “O microfone de ouro”, como era chamado, praticamente me adotou, com passagens inacreditáveis no mundo competitivo da imprensa esportiva. É preciso contar isso, nesse momento carregado de pesar, com seu falecimento, vítima de câncer.
Cheguei ao rádio manauara, depois de oito anos na rádio Alvorada de Parintins, aos 20 anos, entrando na Rio Mar como terceiro narrador. O primeiro era Arnaldo e o segundo Raimundo Nonato Farias. Passado algum tempo, Arnaldo começou a dizer que eu estava pronto para narrar um Rio-Nal, a grande meta de qualquer narrador esportivo da época, década de 1980. Era jogo para mais de 50 mil pessoas, na primeira versão do estádio Vivaldo Lima. Num desses jogos, quando faria a abertura para ele, das 14h às 16h, Arnaldo me procurou e disse: “Poupa tua voz porque você vai narrar esse Rio-Nal”. Fiquei muito surpreso, porque, sem ele, o natural era que Nonato fosse convocado.
A surpresa foi ainda maior quando, na hora da entrada dele, 16h, com os times entrando em campo, lá vem Arnaldo Santos, com um copo de mel e limão, dizendo estar rouco e sem condições de narrar. O saudoso Orlando Rebelo ainda comentou: “Se você tivesse me dito antes teria convocado o Nonato”. E ele respondeu: “O Marcos está pronto. Deixa com ele”.
Essa história diz muito do caráter de Arnaldo Santos. Todos sabem que ele era do tipo “fominha por microfone”. Rio-Nal era quase um ritual na família dele, com o pai, seo Caetano, torcedor fanático do Nacional. Ele, rionegrino de carteirinha, só continha a emoção nas vitórias para não magoar o pai, que levava e trazia do estádio.
Há outra história nossa, que faço questão de compartilhar.
No fim da década de 1980, deixei a rádio Ajuricaba, chateado com um diretor. Arnaldo, que era o diretor-geral, mas não interferia nas decisões das chefias, tentou apaziguar a situação. Não deu. Fui para casa. Era setembro. No Natal, desempregado, a família não tinha nenhuma perspectiva de festa. Não havia sequer o que comer. De repente, um carro para e Arnaldo sai dele, todo sorridente. “Vim trazer os votos de Feliz Natal”, disse. E trazia também os envelopes com os salários de setembro, outubro, novembro e dezembro, mais o 13º. Chorei feito uma criança. “A única coisa que te peço é que você volte a trabalhar”, disse-me. Voltei. Correndo. No dia seguinte.
Troquei a Rio Mar pela Ajuricaba porque, ao assumir a emissora, Arnaldo cobriu os salários que eu ganhava lá, mais Assembleia Legislativa e jornal A Crítica. Depois, me autorizou a retomar a Assembleia e me levou para a TV Ajuricaba, depois Rede Brasil Norte (RBN), adquirida pelo Grupo Simões. Ou seja, em poucos meses, triplicou meu salário.
Doente, mas cheio de vida, Arnaldo me ligava para pedir que escrevesse sobre determinados temas, neste portal. Quando via que era ele, atendia o celular com um “O microfone de ouroooo”. Caíamos na gargalhada, lembrando os bons tempos do rádio.
“O tempo é tudo e marca”, querido amigo, definindo que hoje foi o seu dia de partida. Amanhã (07/01), o carro de som com as músicas de Frank Sinatra, que você pediu para acompanhá-lo, estará lá. Os médicos diziam que isso aconteceria poucos meses depois de descoberto o câncer, em 2016. Duro na queda, teimoso, você aguentou esses oito anos.
As lembranças são muitas. Eternas. Tenha a certeza de que todos os que conviveram com Arnaldo Santos têm histórias parecidas com estas. O microfone de ouro, nunca vai silenciar. Descanse em paz. Você construiu o melhor para esse momento.
Muito juSta e merecida a homenagem quue você presta a Arnaldo Santos. Foi um profissional completo.
R.I.P. Rest In Peace Giant Arnaldo Santos.