Cientistas desvendam processo de inflamação relacionado às formas graves da Covid

Cientistas desvendam processo de inflamação relacionado às formas graves da Covid

O processo inflamatório é considerado uma das causas do agravamento da Covid-19. Embora a inflamação seja um mecanismo natural do organismo, quando exacerbada, ela pode pode danificar as células do próprio corpo, provocando lesões em diferentes órgãos.

Pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz Minas) desenvolveram um estudo que mostra como esse processo inflamatório se desencadeia e se desenvolve no organismo. A resposta pode estar na indução de um tipo específico de anticorpo, chamado afucosilado. Os achados foram publicados na revista Nature.

Ao invadir o organismo humano, o novo coronavírus dá início a um processo de replicação viral, gerando várias cópias de si mesmo. Nessa etapa da infecção, o sistema imunológico é acionado e passa a produzir o anticorpo afucosilado, que consegue neutralizar o vírus e impedir a entrada nas células do tecido humano.

No entanto, os pesquisadores descobriram que o anticorpo também provoca um processo de captura e digestão (chamado fagocitose) por parte dos monócitos, que são células de defesa do organismo. No processo de fagocitose, essas células do sistema imune ativam complexos de proteínas (inflamossomas), que causam a morte dos monócitos infectados (condição conhecida como piroptose).

Organismo

O estudo aponta que é justamente esse processo que acende o sinal de alerta do organismo, que começa então a produzir novas células de defesa, desencadeando uma cascata inflamatória.

A pesquisadora Caroline Junqueira, coordenadora do estudo, explica que as células mortas causam uma tempestade de citocinas, proteínas envolvidas na regulação da resposta imune, gerando mais inflamação.

“Os monócitos em piroptose estouram e liberam componentes que dão sinais de perigo ao organismo. Com isso, o sistema de defesa recruta outras células e, quanto mais recruta, mais inflamação vai ocorrendo. Ou seja, os monócitos conseguem agir abortivamente, de forma a impedir a replicação do vírus, mas isso ocorre por meio do processo de piroptose, que causa uma imunopatologia, que é quando a defesa é prejudicial ao organismo hospedeiro”, afirma Caroline, em comunicado.

Anticorpo associado à infecção

Os pesquisadores da Fiocruz destacam que nenhuma das vacinas contra a Covid-19 induz a produção do anticorpo afucosilado, produzido somente pela infecção. Para a coordenadora do estudo, os resultados abrem perspectivas para tratamentos da Covid-19 e reforçam a importância da imunização.

“Muitas pessoas pensam que é bom pegar a Covid-19 para se tornar imune. A questão é que, nesse caso, a pessoa vai correr o risco de ter uma inflamação sistêmica. Com a vacina, não tem essa possibilidade. Nossa pesquisa constatou que o plasma de indivíduo vacinado não induz a produção do anticorpo afucosilado“, destaca a pesquisadora.

As descobertas trazem novos indícios para a busca por candidatos a medicamentos com foco na inibição dos mecanismos de morte celular inflamatória. Para realizar o estudo, os pesquisadores fizeram diferentes análises em amostras de sangue de pacientes com a Covid-19 e também de indivíduos saudáveis vacinados, de forma a comparar os resultados.

Os próximos passos incluem novas pesquisas com o objetivo de correlacionar a gravidade da doença à quantidade de anticorpos afucosilados produzidos.

“Em outra pesquisa que será publicada em breve já constatamos que, em modelos de camundongos humanizados, ao eliminar o vírus, a inflamação permanece. Outros estudos a serem feitos poderão detalhar ainda mais esse processo inflamatório e suas consequências”, afirma.

Controle da inflamação

O baricitinibe, primeiro medicamento para o tratamento da Covid-19 incorporado ao Sistema Único de Saúde (SUS), atua na regulação do processo de inflamação do organismo.

Isso acontece a partir de um mecanismo de inibição de enzimas chamadas Janus quinase que, entre várias funções biológicas, também atuam na ativação da inflamação nas células do sistema imunológico.

O remédio será disponibilizado para tratamento de pacientes adultos hospitalizados que necessitam de oxigênio por máscara ou cateter nasal. O fármaco já conta com registro no Brasil para o tratamento de quadros moderados a graves de artrite reumatoide e dermatite atópica.

Em janeiro, o baricitinibe foi adicionado à lista de medicamentos recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para o tratamento da Covid-19. De acordo com a OMS, o fármaco pode ser utilizado em pacientes com quadros graves ou críticos em associação com outros recursos, como os corticoides.

A partir do controle da inflamação, é possível reverter o agravamento da doença e reduzir a necessidade de ventilação artificial. Segundo a OMS, a utilização do medicamento não levou ao aumento nos efeitos adversos.

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