Os bastidores (ou boa parte deles) da eleição na Câmara Municipal de Manaus

A eleição para a presidência da Câmara Municipal de Manaus foi um prato cheio de notícias. A maioria impublicável, nos veículos tradicionais. Soube de algumas coisas. Reparto com vocês:

Amigo de Amazonino

Isaac Tayah, e não Homero de Miranda Leão, e menos ainda Mário Frota, era o mais próximo de Amazonino Mendes. Quem tem memória lembra que, em outras épocas, com o atual prefeito fora do poder, Tayah permaneceu com ele. Tanto que é do PTB, partido ao qual Amazonino pertence, e foi líder da base governista até as vésperas da eleição para presidente da Câmara Municipal de Manaus, enquanto Homero era apenas o vice-líder. Razão do rompimento? Achou-se desprestigiado com a indicação do colega.

Sopa no mel

Isaac Tayah foi a Eduardo Braga para pedir que intermediasse o apoio de deputados federais com influência sobre vereadores, em busca de votos. Sabia que, se fosse diretamente, teria dificuldade em conseguir sensibilizar tais parlamentares – especialmente Sabino Castelo Branco, presidente regional do PTB e pai do vereador Reizo Castelo Branco. Braga o ouviu e percebeu a fragilidade da base de Amazonino. Conversou com deputados em separado e logo se formou uma corrente de captação de votos. Mas o sinal verde para o engajamento na campanha veio mesmo com o rompimento público de Tayah com o prefeito.

Reuniões

Ficaram famosas as reuniões de vereadores em torno dos candidatos. O “Dia D”, porém, foi quando Eduardo Braga chamou à sua casa um grupo de vereadores. O número mais coincidente de presentes, entre as fontes do blog, é 15.

Ligação direta

Esse número, 15, porém, seria insuficiente para eleger Tayah, certo? Errado. Ao mesmo tempo, na casa do vereador Mário Frota, sete vereadores que fazem oposição fechada a Amazonino estavam reunidos. E havia uma ligação direta, via telefone, com Braga e companhia.

Defecções

A matemática indicava que Tayah já podia contabilizar 22 votos. Braga, porém, disse a vários interlocutores que contava com 21. Quem trairia? Ninguém sabe. Mas ele contava com Jefferson Anjos e Leonel Feitoza, que votaram em Homero, e teria recebido do próprio deputado estadual Nelson Azedo a garantia de que o filho dele, Nelson Amazonas, ou votaria a favor de Tayah ou não iria à sessão. Nelsinho não só foi, como votou a favor de Homero com (a única) declaração de que o fazia “a pedido de Amazonino Mendes”. Leonel foi um dos principais articuladores de Homero.

Grupos

Hora da votação se aproximando, nervosismo aumentando, e formaram-se dois grupos na Câmara Municipal, um pró-Homero e outro pró-Tayah. Chega o vereador Nelson Amazonas. O lado de Tayah, que não esperava vê-lo por lá, prende a respiração. Ele se dirige ao grupo de Homero. Chegou a bater certo desespero.

Números

Eram 8h da manhã quando as contabilidades foram fechadas. Todos sabiam que a decisão seria por um voto. Houve marcação colada nos, digamos, “eleitoralmente” mais frágeis. Demissões de familiares, ocorridas lá no começo da administração de Amazonino, foram lembradas e convidadas a participar do convencimento de indecisos (cuidado que a frase tem licença poética). O nervosismo chegou ao auge.

Mário Frota

O experiente várias vezes deputado federal, ex-deputado estadual, ex-quase-senador e ex-vice-prefeito Mário Frota ouviu, pouco antes das luzes da ribalta da TV Câmara se acenderem, o canto da sereia de Amazonino. No depoimento de um vereador da oposição, Mário “ficou encantado”. Houve correria. O suspiro de alívio, quando ele fez um enfático discurso anti-Amazonino, retirando a candidatura e apoiando Tayah, pode ser ouvido lá no Puraquequara.

Anti-Amazonino

A oposição não chegou a pensar que teve nas mãos a chance de vencer a eleição. Bastaria que tivesse aceitado a oferta de retirada da candidatura de Homero de Miranda Leão e o apoio em bloco a Mário Frota. Estava comprometida apenas em derrotar Amazonino. Cegamente.

Porcentual decisivo

Amazonino (ou alguém de seu grupo), só fez uma exigência a Mário Frota: que 60% da mesa diretora fosse composta por pessoas indicadas por ele. Esse porcentual é justo o número regimental para decisões nevrálgicas, inclusive a própria anulação da eleição. Na hora “H”, em meio à confusão do plenário, o regimento acabou vindo em socorro a Isaac Tayah. E Frota recuou.

Escuta

Se por acaso houvesse uma escuta telefônica capaz de captar os diálogos trocados nos bastidores dessa eleição, a essa altura estaria disponível material suficiente para escrever um livro. E havia, claro que havia!, alguém muito bem informado de tudo o que se passava nos bastidores.

Independência

Isaac Tayah firmou o discurso de que se rebelou porque “a Câmara não pode ser um anexo da Prefeitura”. Tem razão. Mas se o Legislativo Municipal se tornou um anexo da Prefeitura, ele, Tayah, na condição de líder do prefeito ao longo de três anos, teria sido o principal responsável por isso ter acontecido.

Almoço

Terminada a eleição, cantado o Hino Nacional no plenário, o colégio eleitoral que elegeu Isaac Tayah, em peso, reuniu-se a portas fechadas com o ex-governador Eduardo Braga. Até 17h. Só aí seguiu, em comitiva, para um almoço comemorativo. Na Churrascaria Búfalo, devidamente reservada para tal.

História

2004.

Alfredo Nascimento, convidado por Lula para ser ministro dos Transportes, deixa a Prefeitura e anuncia que o sucessor será, por eleição indireta no colegiado dos vereadores, seu secretário municipal de Economia e Finanças, Aloísio Braga. Luiz Alberto Carijó, presidente da Câmara e até então parceiro de Alfredo, une-se a Amazonino Mendes, fora do poder e aparentemente sem ter nada com isso, para um golpe que redundou na eleição dele próprio, Carijó, para a Prefeitura. O tiro saiu pela culatra. Amazonino perderia a eleição direta para prefeito, no mesmo ano, para Serafim Corrêa.

2010.

Amazonino Mendes, prefeito, indica seu vice-líder na Câmara Municipal, Homero de Miranda Leão, para a presidência da Casa e virtual vice-prefeito de Manaus – já que, em 1º de fevereiro, o vice-prefeito Carlos Souza deixa o cargo para assumir a Câmara Federal. Isaac Tayah se rebela e, apoiado por Eduardo Braga, que aparentemente não tinha nada com isso, ganha a eleição.

O futuro a Deus pertence.

Resumo da ópera

O papel do Legislativo é fiscalizar o Executivo. No caso de Manaus, uma das cidades mais horizontais do mundo, os vereadores têm a obrigação de viver o cotidiano das comunidades mais isoladas, pobres, sem voz e sem quase nenhuma ajuda social para sobreviver, intermediando suas demandas junto à Prefeitura. A Câmara Municipal de Manaus falha nisso. Não tem autonomia. Prova é que se rebelou contra Amazonino, mas, ao mesmo tempo, entregou a rapadura, com oposição e tudo, para Eduardo Braga.

Espera-se de Isaac Tayah que ganhe a estatura necessária para, de fato, promover alguma autonomia, sem radicalismo paralisante – tão danoso quanto a submissão abjeta. Ninguém espere milagres, mas se rolar pelo menos uma “autonomia possível”, já é alguma coisa.

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4 comentários

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  1. Aldenor Rocha disse:

    Marcos Santos, acho que vc lembra da mesma estrategia utilizada pelo proprio prefeito de Manaus Amazonino Mendes em 2004, quando o ex prefeito Alfredo Nascimento, deixava a prefeitura de Manaus, para o ministerio do Transporte, escolheu e deixou acordado com os vereadores de sua base para eleger Aluisio Braga e Paulo Jacob para ser prefeito e vice tampão, quando veio Amazonino fez sua contra proposta a Carijó, e mesmo disfez o acordo e se elegeu prefeito de Manaus, e com a prefeitura na mão fez camapnha explicita para Amazonino Mendes nas eleição para prefeito, mais o mesmo perdeu para Serafim Corrêa.

    Amazonino provou do mesmo veneno, agora e só chorar……

  2. Alice Mosquera disse:

    Olha Marcos Santos invejo vc no modo de escrever e de ser literalmente fiel ao que aconteceu nesse “tsunamy” que foi ( para o Amazonino) a eleição na CMM.
    Quanta licidez e quano conhecimento da historia recente da politica baré para reescrever com detalhes os fatos que circusncreveram e circunscrevem esse e outros temas palpitantes. Parabens.
    Mas, para não ficar apenas no elogio vai aqui uma lembrança vc esqueceu completamenmte a particpação fundamental do Massami nessa que pode ser um dos mais emblematicos e antologicos episodios politicos do Amazonas.

    RESPOSTA:
    É que eu quis entrar só na parte menos conhecida. O episódio do Massami, que deu um jantar de adesão em seu sítio, que deveria ser definitivo para a candidatura de Homero, com a presença de Amazonino e tudo, mas, no dia seguinte, foi um dos mais enfáticos na reunião com Braga, isso todo mundo já havia noticiado. Acrescente que o Amazonino disse ter ficado com ele (Massami) até a madrugada do dia anterior e (fonte do blog informa que) prometeu uma secretaria municipal em troca do voto. Massami ainda teria ligado e pedido que a nomeação se desse até 10h (foi induzido a isso) e Amazonino titubeou. Aí o Massami – que já ia dar uma pernada em cima da pernada – recuou e ficou com Tayah mesmo.

  3. Lobato disse:

    Parabéns pelo texto. Muito explicativo e bem feito. Essas articulações perecem-me normais no jogo político, porém a atitude desse Ma$$ami é indigna de um homem.Também o que podemos esperar de uma pessoa com caráter duvidoso, bajulador dos ricos e enganador dos pobres? É a natureza do escorpião que nele se manifestou.

  4. wadson disse:

    Triste câmara municipal esta nossa. No meio de tudo o que menos interessa é a população. No final da história todos os grupos (3) só seguiam os seus prórpios interesses. Temos todos os tipos de vereadores: uns seguem o interesse do mestre, outros estão sempre contra tudo, outros não sabem nem o que seguir, são bobos da corte e, enquanto isso, a população fica sempre em segundo plano.
    Agora a situação do vereador Massami é no mínimo curiosa (escandalosa). Deveria ser publicada nos anais da política nacional: vereador dá jantar na vespera da eleição e depois vota contra os próprios convidados. Um cidadão desses vendeu a própria palavra. Deveria se envergonhar perante seus eleitores e diante de si mesmo.