Chacina do Compaj tem 210 detentos indiciados pelo massacre e inquérito confirma ordem de “Zé Roberto”, narcotraficante da FDN

Maior chacina entre presidiários da história do Amazonas e do Brasil, o massacre ocorrido no Compaj, em janeiro deste ano, teve 210 detentos indiciados e confirmou que a ordem era para “exterminar” facção rival da FDN, o PCC. Ordem partiu de presídio de fora do Amazonas. Foto: Reprodução

A maior chacina entre presidiários ocorrida no Amazonas e no Brasil, a do Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), que terminou com 56 mortes no dia 1º de janeiro deste ano, resultou no indiciamento de 210 detentos do presídio. As informações da conclusão do inquérito pela Polícia Civil foram divulgados nesta sexta-feira (1º), 8 meses após o massacre, durante coletiva de imprensa na Delegacia Geral.

O delegado-geral da Polícia Civil do Amazonas, Frederico Mendes, juntamente com o delegado-geral adjunto da instituição, Ivo Martins, revelaram detalhes do inquérito que apurou as autorias e as circunstâncias das mortes de 56 detentos. Foram realizadas perícias nos locais das execuções e assassinatos e análises das imagens das câmeras do circuito interno da unidade prisional.

O inquérito produzido tem mais de 2,6 mil páginas, entre oitivas, fotos, áudios, laudos de necropsia e DNA feitos nos corpos, tendo iniciado dia 9 de janeiro e sendo remetido à Justiça no dia 30 de agosto.

Durante as investigações, ficou comprovado que a chacina teve uma ordem externa, partindo do narcotraficante José Roberto Barbosa, o “Zé Roberto da Compensa”, um dos criadores da facção criminosa Família do Norte (FDN), considerado o terceiro maior grupo do país. A ordem era para extermínio detentos ligados ao Primeiro Comando da Capital (PCC), que tem origem em São Paulo, e que é rival da FDN. As duas atuam no Estado e buscavam o domínio dentro dos presídios em Manaus.

“A ordem partiu do presídio federal, do ‘Zé Roberto’, temos nos autos testemunhas oculares da carta que foi lida, dentro da cela dele, em que ficava claro e específico, de forma bem orquestrada, como aconteceria o massacre. A partir do momento da saída da última visita, entrariam em campo, invadiriam a portaria e fariam reféns, para não haver controle estatal, e começaria a chacina propriamente dita”, explicou a delegada Emília Ferraz, corregedora auxiliar da Polícia Civil na Corregedoria-Geral do Sistema de Segurança Pública do Amazonas (SSP-AM), que fez parte da força-tarefa que cuidou do inquérito.

Outra motivação apontada era o comportamento dos presos do PCC, que faziam chacota e familiares dos detentos da FDN, além da rivalidade. “Os alvos principais eram certos e estavam marcados para morrer, e ainda existiam os presos chamados vulneráveis e os estupradores, que estavam com sentença de morte decretada. Nossa maior dificuldade e sucesso foi individualizar as autorias”, completou a delegada.

Segundo Ivo Martins, 350 pessoas foram ouvidas no inquérito. Os trabalhos do grupo contaram ainda com apoio dos delegados Tarson Yuri Soares e Rodrigo de Sá, titulares, respectivamente, da 4ª Seccional Oeste e 20º Distrito Integrado de Polícia (DIP); delegado Rodrigo Azevedo, adjunto da Delegacia Especializada em Homicídios e Sequestros (DEHS), além de 10 investigadores e dois escrivães, que integraram o grupo de trabalho.

Conforme as investigações e o trabalho de inteligência, a chacina poderia ter ocorrido 15 dias antes da data. “De imediato, após o massacre, foram feitas as primeiras diligências e montada a força-tarefa para elucidar o caso, as mortes e os autores. Podemos dizer aos criminosos que cometeram esse delito que todos deverão ir à Justiça responder por estes atos. A Polícia Civil está de parabéns, por ter concluído, de forma inédita, um dos maiores inquéritos dentro da apuração de crimes em presídios. Em tempo recorde identificaram os autores e quem foi barbaramente executado”, falou o delegado Frederico Mendes.

Ivo Martins acrescentou que as informações sobre eventuais rebeliões são inerentes ao sistema prisional e que esses informes são recebidos e averiguados. “Mas não significa que vão ocorrer rebeliões. A data de 1º de janeiro foi emblemática em razão de ser comemorativa”.

A chacina

A rebelião iniciou, exatamente, às 15h59, quando alguns detentos, integrantes da FDN, renderam os agentes penitenciários. Em seguida trocaram tiros com a guarnição da Polícia Militar que estava na portaria 3 do Compaj, para ter acesso a todos os presos de uma área chamada “Seguro”, local onde ficavam custodiados os presos considerados vulneráveis e 26 detentos da facção criminosa PCC. Neste local, transformado em cenário de guerra e terror, foram mortos 23 presos do PCC.

Segundo a SSP-AM, os corpos de seis pessoas foram jogados para fora do presídio, sem as cabeças. Ao longo daquela noite, dezenas de pessoas foram para a porta do presídio aguardar informações de parentes presos. A chacina levou mais de 17 horas e, após negociações, os presos libertaram reféns e entregaram as armas.

Com a crise carcerária no Estado, a Força Nacional foi acionada e continua na barreira de acesso ao Complexo Penitenciário Anísio Jobim, onde a maioria dos detentos foram assassinados.

Processo tem mais de 2.600 páginas e 350 pessoas foram ouvidas durante inquérito. Fotos: Divulgação PC-AM

 

Polícia Civil finalizou o inquérito em oito meses, apresentando provas, áudios, vídeos e depoimentos de testemunhas, familiares, servidores do sistema, autoridades e fontes sigilosas. Parte mais difícil foi individualizar ação dos envolvidos na chacina

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