Da retórica ao marketing político. Da ilusão à realidade do novo mundo

Francisco R. Cruz

A luta do homem pelo poder faz parte da sua natureza. Mas o poder não é o fim perseguido, pois, no fundo o que se quer é ser reconhecido. No espectro dessa busca aparece a política, onde ele estaria de forma mais avassaladora. É lá onde brilha com mais intensidade esse troféu objeto de desejos, cobiças e invejas desmedidas. Nela as paixões explodem na plenitude das suas contradições expandindo os limites da razoabilidade, resultado da teatrocracia responsável pelas tragédias, dramas e comédias, numa afirmação da retórica como arma natural do ser humano.

Mas o que seria retórica? Pensadores como Sócrates e Aristóteles a definiam como: “A arte de persuadir pela argumentação”. Platão não concordava com seu uso. “Colocar ênfase nos modos de persuasão em vez da verdade, merece condenação moral”. Dizia ele.

No Brasil em particular, um bom período do século XX foi vencido pela retórica, desde os debates estudantis aos comícios eleitorais, onde aparecia soberana nos palcos, como o principal ingrediente da química forjadora de tribunos excepcionais. Nesses comícios, com vistas à conquista do voto, a maestria dos oradores transpunham as barreiras da curiosidade, para vender fantasias e ilusões, tão ao gosto da natureza humana, dinâmica que os aproximava de Sócrates e Aristóteles, afastando-os definitivamente de Platão.

O apelo foi sempre direto à mente humana a mesma ferramenta responsável, posteriormente, pelos avanços inigualáveis das ações de marketing. Foi nesse contexto que as identidades se cruzaram e fez inaugurar a era do “Marketing Político”. A partir de quando a política não seria mais a mesma.

Desde então, a dinâmica de conquista do voto sofreu profundas transformações. Talento e vocação, habilidades requeridas pela política até então, foram transformadas em produtos de maquilagem nos portfólios das agências de publicidade, onde são vendidos a peso de ouro. Quem pode comprar aumenta as chances de eleger-se. Os tribunos perderam espaço para o dinheiro, que assumiu decisivo protagonismo no processo eleitoral. Esse quadro, foi fator determinante no aumento da carga tributária, empobrecimento intelectual dos parlamentos e a generalização da corrupção país afora.

Ao mesmo tempo, pressionado pelos encargos paternalistas da constituição de 1988 e o arcabouço de legislações arcaicas que vigoram desde a primeira metade do século XX, o estado não consegue modernizar-se. Perdido nesse emaranhado de regras ineficientes e sem reverter a baixa qualidade da educação há anos, a Nação brasileira não sai da rabeira no ranking internacional da produtividade, ralo por onde escapam alguns bilhões de reais anualmente.

O resultado desse desenho é a degradação total dos serviços públicos pela falta de recursos, como alegam os governantes. Mas, quando deles se esperam atitudes afirmativas, em absurda contradição, reagem com o gasto de fortunas em ações de marketing para nos convencer de fantasiosas melhorias, que no momento anterior, diziam eles não acontecer, exatamente, pela dita falta de recursos.

O exemplo mais contundente nesse aspecto é o da educação. Sistematicamente reprovada nos exames internacionais e nas avaliações internas, a má qualidade está presente no sentimento nacional. Sem essa percepção (essência da atividade), o marketing do governo cassado não resistiu a oportunidade e em momento de pura gozação ou muita incompetência (não há outra explicação) criou o slogan: “Brasil, pátria educadora”. Enquanto rodava a campanha para consolidar o slogan, o país foi surpreendido pelo aumento do analfabetismo, interrompendo o viés de queda experimentado há anos.

Sem acreditar que são por esses ralos que o poder se vai esvaziando, o sistema político busca no marketing a salvação de tudo. Ainda entende que o povo pode ser convencido por qualquer campanha. Já foi assim, é verdade, mas está mudando. E mudando muito rápido. A nova tendência (que pode não ser a mesma amanhã), foi posta nas eleições de 2016.  Candidatos com grande potencial insistiram no marketing da difamação e das promessas impossíveis, características da velha política, e se frustraram. Lucrou quem apostou no novo. E o novo aqui não se trata de idade como se vem confundindo na política. Trata-se de posturas novas. Jeito novo de fazer. De comunicar-se.

É preciso ter em conta que, nessa nova ordem, buscar o poder para se ver reconhecido pode ser uma busca em vão. Pois o poder está se esfarelando e a diversidade matando o reconhecimento. Tudo é efêmero. O cotidiano deixa de existir. O conhecimento novo revoluciona as realidades e faz mudar a paisagem do mundo a todo momento.  Só aparecerá bem na foto, quem tiver essa percepção e a capacidade de reinventar-se em igual velocidade. Fora dessa perspectiva, todos seremos destaques da mesmice. Não é fácil. Mas esse é o mundo. O mundo novo.

 

Francisco Cruz

Francisco Cruz

* Francisco R. Cruz é empresário e trabalhou muitos anos na área de tecnologia e, entre 2001 e 20...

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