Bernardo Cabral

Lembro-me do Bernardo na casa de minha família, no Rio, em dezembro de 1966. Disse ao meu pai: “quem diria, Arthur! Um menino humilde do Careiro foi o Deputado Federal mais votado desta eleição”.

Bernardo, que vinha de excelente atuação na Assembleia, conquistou cadeira na Câmara para mandato curto, porém profícuo. Tomou posse em fevereiro de 1967. Foi cassado no dia sete desse mesmo mês, dois anos após, em 1969, pela brutalidade do Ato Institucional Nº 5 (AI-5), instrumento de que a ditadura se utilizou para deter a crescente maré de protestos de rua – com predominância de estudantes, artistas e intelectuais – que a acuava. A isso se juntou a criação da Frente Ampla, liderada pelos ex-Presidentes João Goulart e Juscelino Kubitschek e pelo arqui-inimigo de ambos, o ex-Deputado Federal  e ex-Governador da Guanabara, Carlos Lacerda.

A tensão política atingiu o ponto culminante quando, no restaurante do Calabouço, assassinaram o estudante Edson Luiz, que virou símbolo e mártir da resistência a um regime que dava sinais de esgotamento. O AI-5 veio para silenciar as ruas, cassar mais mandatos, suspender mais direitos políticos, censurar a imprensa, “legalizar” a invasão de domicílios, negar direitos básicos da civilização, como o habeas corpus.

Bernardo era Vice-Líder de Mário Covas. O destino honrou esses dois brasileiros e mais meu pai na mesma lista de cassação. Lutaram juntos, tombaram juntos, para que o Brasil não se ajoelhasse.

Se as eleições diretas para os governos estaduais não estivessem proibidas e Bernardo não tivesse sido proscrito, ninguém seria capaz, em 1970, de deter sua caminhada rumo ao Palácio Rio Negro pela oposição, contra máquinas poderosas e o poder econômico. Os anos de chumbo traçaram destino diverso e lá foi ele para sua banca de advocacia, sem perder as esperanças e sem se deixar dominar pela amargura.

Não parou. Fez-se Secretário-Geral do Conselho Federal da OAB e, a seguir, Presidente dessa valorosa instituição. Com a anistia, retornou ao Amazonas e, em 1986, retomou seu mandato de Deputado Federal, novamente com a maior votação do pleito. O passo seguinte foi tornar-se Relator-Geral da Constituinte que redundou na Carta de 1988.

Em 1994, chegou ao Senado como um dos seus membros mais ilustres, honrando a representação amazonense. Hoje, prestando consultoria jurídica à Confederação Nacional do Comércio, resume sua vida como um punhado de vitórias, algumas duras provações e muitas amizades sólidas.

Era um dos grandes amigos de meu pai. Dei meu filho mais velho, deputado Arthur Bisneto, para que apadrinhasse. Quando Arthur Virgílio Filho revive, no registro dos 25 anos de seu falecimento, e meu compadre completa seus 80 anos, desejo, com fé, que ambos sirvam de exemplo às gerações que estão chegando.

O Amazonas merece que seja assim.

 

Arthur Virgílio Neto

Arthur Virgílio Neto

* Arthur Virgílio Neto é diplomata, ex-líder do PSDB no Senado e prefeito de Manaus

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