As cores, sabores e odores da Índia

Por: Marcelo Lima Filho

Nova Déli – Após dedicar a minha primeira semana em Nova Déli ao reconhecimento da área, hoje arrisquei algo mais audacioso. A minha opção foi visitar o Forte Vermelho, uma das mais frequentadas atrações turísticas locais, utilizando o metrô, rumo à velha Délhi. Ao contrário da nova, planejada pra ser a capital do país, a região da periferia, antiga e desordenada, tem maior conexão com a Índia que permeava o meu imaginário.

Uma visão geral do Centro antigo de Nova Déli. Fotos: Marcelo Lima Filho

Depois de uma corrida de Riquixá (R$ 1,89) do hotel à estação de metrô mais próxima, meu destino foi a estação Chandni Chowk (bilhete R$ 0,63), distante cerca de 25 minutos de viagem. Após a já rotineira inspeção no raio-x, pude degustar o sistema que se mostra seguro, pontual e eficiente. Fotografar não é permitido – sujeito a multa – e o último vagão é exclusivo para mulheres. Trata-se de política pública para evitar casos de assédio sexual, comuns, principalmente nos horários de rush.

Vencido o deslocamento, já na saída da estação, passei a deparar-me com os verdadeiros sabores, cores e odores da Índia. Contei dezenas de pedintes, crianças, jovens e idosos em todo percurso, dirigindo as mãos à boca, rogando algo pra comer. O comércio popular lembra um pouco a Rua 25 de Março – no centro de São Paulo -, com o agravante de que eu parecia transitar numa gigantesca latrina. O odor primeiro se mistura à fumaça dos kebabs – carne grelhada num espeto -, depois o mix recebe a fragrância das especiarias vendidas em sacos sobrepostos à imunda calçada. A fome me passou tão longe, que mesmo passando em frente a um McDonald´s (pela primeira vez), segui adiante. Embora um pouco chocado com o vasto conjunto de percepções horrendas, senti-me muito seguro.

Uns 15 minutos depois, entro num território diferente. Uma espécie de Bagdá, no coração da velha cidade, onde inclusive só se fala árabe. A explicação é a existência ali de uma enorme mesquita sunita, devidamente cercada por um perímetro de segurança – em virtude do risco de ação terrorista – que induz o comércio de artigos religiosos em todo o seu entorno. Como eu não estava devidamente paramentado, não me foi permitida a entrada.  Segui viagem.

Embora ainda sem fome, cinco da tarde me pareceu uma hora razoável pra almoçar e, buscando a recomendação de uma amiga panamenha, cheguei ao laureado Karim´s, especializado em comida árabe. Espelunca igual não se encontra nem no entorno do porto de Tabatinga, mas eis que o Chicken Tikka, que me foi sugerido pelo amigo Denis Minev, desceu pra lá de honestamente. Preço da orgia: R$ 10,00.

Especiarias indianas colocadas à disposição dos chefs em grande volume.

Já na saída do almoço, fui abordado por uma criança de não mais que 6 anos me pedindo algum trocando – com o gesto clássico acima descrito – que, ao perceber o meu olhar de abatimento, me acompanhou por uns trezentos metros, puxando-me pela calça ininterruptamente. Sad but true.

Para o bem da verdade, a visão na chegada ao tal do forte, uma imponente construção mongol, já estava pra lá de toldada, e como já passava das oito da noite, optei pelo breve retorno, após meia dúzia de fotos. Afinal, o itinerário seria idêntico, com um detalhe: senti um inenarrável alívio na chegada à estação de embarque, porto seguro depois da barbárie.

Uma emoção profunda me tomou e tive que me esforçar pra conter as lágrimas.

 

* Marcelo Lima Filho é ex-secretário estadual de Planejamento do Amazonas e está em Nova Déli para um curso de especialização com duração de três meses, para o qual recebeu bolsa de estudo do Governo da Índia.

** Publicado originalmente no http://www.marcelofilho.com/

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1 comentário

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  1. ozeneide casanova disse:

    Marcelo,
    experiencias como essa são unicas. Nao tem preço mas com certeza muito valor. Fiquei tentando acompanhar sua aventura e imagino suas reflexoes.
    Boa caminhada..
    abs
    Ozeneide