Chef critica ‘jantar amazônico’ sem chef local

O chef Babu Loureiro enviou, via FaceBook e este blog, um desabafo sobre o Jantar Amazônico que permeia o Fórum Mundial de Sustentabilidade. Babu é responsável pela revitalização de uma área do Centro da cidade, morta (mortinha da Silva!), na avenida Ferreira Pena, entre 10 de Julho e Monsenhor Coutinho, onde fundou o restaurante/pub Chefão e a chopperia Da Viúva, aproveitando a arquitetura e acrescentando estilo ao casario tradicional.

Percebam que não se trata de um texto comum. Trata-se de um panorama da gastronomia manauara. E todo mundo sabe que não existe turismo sem gastronomia, nem gastronomia sem cultura, incentivo ou, melhor ainda, um movimento que conduza as almas de determinado ambiente a cultivar estudo, prática e comercialização desse segmento, que consegue elevar o ato de comer à categoria de arte.

Conheço a cozinha dos chefs citados por ele. Percebo agora que apertei a mão de todos. Só não havia percebido que, sem qualquer sistematização ou um programa governamental que indicasse esse caminho, eles formam uma centelha pronta para pegar fogo na culinária local. Estão prontos para, com um mínimo de organização, criarem algo que venha a se tornar, quem sabe, não custa sonhar, a Alta Gastronomia Tipicamente Manauara.

Publiquei o desabafo do chef Babu como comentário à matéria sobre a visita do ex-presidente norte-americano Bill Clinton a Manaus. Mas vale a pena criar um post especialmente para ele. Leia, a seguir, a veja se não tenho razão:

“Jantar amazônico sem chefes da nossa cidade (sem sustentabilidade)

Lendo o jornal A Crítica domingo fiquei decepcionado com uma certa matéria do caderno vida & estilo. Não fiquei decepcionado com o caderno, nem com o jornal, pois tal caderno apenas estava divulgando um certo fórum que acontecerá dentro de alguns dias em nossa cidade.
O “Fórum mundial de sustentabilidade”. Que lindo o nome de tal evento, “Fórum mundial de sustentabilidade”. Onde está a sustentabilidade?
Está certo que todo seminário e fórum são feitos para debatermos e trocarmos idéias ou talvez colocarmos o que estamos fazendo perante tal assunto, mas o que fazemos realmente é bem diferente.
Vejam os palestrantes do evento. Vejam se há algum amazonense. Vejam se tem algum palestrante do único país realmente alto-sustentável da América do Sul (o Chile).
Vamos pular esta parte geo-política e entrar na área que realmente me interessa, a gastronomia.
Fico muito triste neste momento,com uma certa vontade de largar tudo o que estudei e tudo o que faço para mudar a cena da gastronomia e do entretenimento de nossa cidade.
Caros amigos me digam: precisa trazer a Morena Leite pra fazer uma moqueca de pirarucu seco, pra ficar ruim igual o jantar da Casa Ccor no ano passado? Será que nós, chefs, que atuamos na cidade, não temos condições de fazer um evento deste porte – nós que conhecemos desde sempre nossas iguarias?
Parece que não. Não adiantou nada o chef Babú loureiro (Chefão e Da Viúva) e o chef Felipe Schaedler (Banzeiro e Di Fiori) terem gastado tempo de estudo, tempo de trabalho, tempo de estágio e milhares de reais em formação. Não adianta o Rogério ter ido estagiar com o Érick Jackin. Não adianta a Helena do Village mandar o Idelfonso para estagiar no Fasano. O Francis do Domus elaborar fusões entre a França e o Amazonas. O Hiroya unir Japão e Amazonas, todos os anos. O Ricardo Lorenzi acho que até nos deixou por tanta falta de reconhecimento.
Bem só quero deixar meu protesto. Enquanto temos que pagar para estar em alguns eventos outros estão vindo para ganhar e fazerem o que não sabem e ainda serem aplaudidos (ohohoohohohoohoh).
Vou me desculpando, se fui um pouco arrogante, mas tais coisas que acontecem em nosso Estado às vezes me tiram a vontade de continuar lutando por um trabalho melhor.
“Quero só o que vem lá de fora”. (Nicolas Júnior).”

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4 comentários

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  1. Observador Urbano disse:

    Infelizmente, não temos o hábito e a cultura de valorizar nossos profissionais locais. O pensamento corrente, porém, arcáico e ultraje é: “O que é de fora é melhor e mais competente”. Pura ignorância!
    Faz-se necessário a quebra desse paradigma, visto que nossos profissionais, principalmente os da gastronomia, são qualificados e apresentam alto nível de profissionalismo.
    É lamentável saber que os participantes do evento social, Fórum Mundial de Sustentabilidade, não degustarão do verdadeiro sabor da culinária manauara.
    QUE MANCADA DOS ORGANIZADORES DESSE EVENTO!

  2. Paulo Oliveira disse:

    Concordo plenamento com o chef Babu.Por certo que temos muito a evoluir em todos os sentidos,inclusive na gastronomia,mas é certo também que a qualidade dos pratos servidos,desenvolvidos e apurados pelos chef’s locais, evoluiu bastante.Como certo é crer que o conhecimento,o perfeito uso de peixes e temperos amazonicos, nossos locais são imbatíveis.Que adianta servir pirarucú com gosto de robalo,pargo ou qualquer outro peixe de mar? Parabéns ao Babu tanto pela qualidade de suas casas como a clareza de ideias.

  3. limanilton disse:

    Marcos, é o preço que pagamos por nos sentirmos internacionais, a qualidade local não é prestigiada não é valorizada. Já vi pessoas influentes e famosas comerem o jaraqui do Galo Carijo, a peixada do canto da peixada, as iguarias do Moranguetá o peixe do Bosco lá do Ajuricaba, e muitos salgadinhos da banca de guloseimas que fica na Ramos Ferreira em frente a Academia Amazonenses de Letras.
    Só para dar água na boca: Um pirarucu cozido com maxixe e gerimun no leite de coco que a tia Ray de Parintins faz, HUMMM….; Muqueca de pirarucu assado na folha da bananeira, outro HUMMM…; miúdo de pirarucu com banana pacovã, maxixi, jerimum com muita farinha carossuda, êita mais um HUMMMMMMM….; Ventreixa de pirarucu cozido acompanhado de pirão de farinha do uarini.etc,. Tenho certeza de que os convidados do Furum de Sustentabilidade diriam: ” Até a receita do pirarucu da amazônia está sendo preservada neste Forum”.
    “POR FAVOR SENHORES SUSTENTÁVEIS, NÃO DEIXEM QUE O NOSSO PIRARUCU SEJA TRANSFORMADO EM ROBALO”.

  4. bruno disse:

    Porto de Lenha, tu nunca serás Liverpool com a cara sardenta e os olhos azuis…

    Infelizmente, tenho de concordar com você… meu juízo desse evento é o de que sua proposição e realização em plena Amazônia – apenas pelo puro exotismo, tal qual o ignóbil músico do “Reset” (que há muito deixou de ser “restart” – é assegurar a sustentabilidade da RIQUEZA desses canastrões que aqui estiveram.

    Ora, qual a sustentabilidade dos hábitos grosseiros e excêntricos desses senhores? Que o diga o Montecristo de US$ 50 do Bill! Que o diga o balcão de negócios em plena Manaus promovido pelo almofadinha João Dória! Que o diga os globais que nada mais vem fazer aqui que vem beleza, alguns já nem tão belos e belas assim…

    Não esmoreça, Babu. Educação é um processo lento, principalmente o de autoafirmação desse nosso povo amazônico que ainda insiste estar na decadente Belle Époque.